Acórdão nº 0544363 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 06 de Fevereiro de 2006

Magistrado ResponsávelFERREIRA DA COSTA
Data da Resolução06 de Fevereiro de 2006
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto: B.......... intentou acção emergente de contrato individual de trabalho, com processo comum, contra C......., pedindo que se reconheça o direito do A. a ser remunerado pelo mesmo valor que um docente do ensino público com a mesma habilitação e antiguidade, a partir do dia 1 de Setembro de cada ano, a que este tenha esse direito e que se condene a R. a pagar ao A. as diferenças salariais, no valor global de € 7.583,10.

Alega, para tanto, o A. que sendo professor do ensino particular no Colégio D........., de que a R. é dona, esta determinou em Outubro de 1990, com assentimentos dos seus trabalhadores professores, neles incluídos o A., que o pessoal docente passaria a auferir o mesmo que os docentes do ensino público, o que passou a concretizar em 1 de Outubro de cada ano pela atribuição de um subsídio de equiparação, correspondente à diferença entre a retribuição de um professor do ensino particular e a de um professor do ensino público. Porém, a partir de Janeiro de 2002, a R. deixou de actualizar o subsídio de equiparação, até que ele foi consumido integralmente pela retribuição, que se foi actualizando, de um professor do ensino particular. Daí que tenha vindo pedir as diferenças respectivas.

A R. contestou alegando, em síntese, que o subsídio de equiparação foi atribuído como medida conjuntural, a título de liberalidade e foi retirado depois de um processo de informação aos professores, que nada opuseram. Por outro lado, a sua atribuição é nula, dada a indeterminabilidade do seu quantum, por depender apenas de terceiros, o Governo, sendo certo que ocorreu uma alteração anormal das circunstâncias, a determinar a resolução da declaração da R., sob pena de inviabilidade económica e financeira.

Realizado o julgamento sem gravação dos depoimentos prestados em audiência e assente a matéria de facto, sem reclamações, foi proferida sentença, sendo a acção julgada parcialmente procedente, reconhecendo ao A. o direito a ser remunerado pelo mesmo valor que um docente do ensino público com a mesma habilitação e antiguidade, a partir do dia 1 de Setembro a que este tenha esse direito e condenando a R. a pagar ao A. as diferenças salariais, no valor de € 6.864,38.

Inconformada com o assim decidido, veio a R. interpor recurso de apelação, pedindo que se lhe dê provimento, com a consequente revogação da sentença, tendo formulado a final as seguintes conclusões: I - No caso sub judice, resulta pelas razões atrás expostas, que a medida de atribuição do "subsídio de equiparação" foi sempre encarada como uma medida conjuntural, analisada anualmente quanto à sua possibilidade de atribuição.

II - Que, e como resultou da matéria dada como assente, o Recorrente quando alterou a forma de aplicação do subsidio de equiparação, com vista ao seu gradual desaparecimento, fê-lo sem prejuízo do montante global do rendimento recebido pelos professores, nomeadamente o Recorrido.

III - O Juiz a quo parece ter descontextualizado pelo menos em parte, o que efectivamente está no substrato, no teor intrínseco do artigo 82.º da LCT. Porquanto, in casu o tal subsidio de equiparação nunca esteve previsto, nem fez parte integrante da génese do contrato de Trabalho que liga o Apelado à aqui Apelante.

IV - No caso em apreço, o subsidio de equiparação não deverá ser considerado como retribuição, nem como tal susceptível de ser considerado nas legítimas expectativas do Recorrido, na medida em que não estava previsto no Contrato de Trabalho respeitante a este caso concreto ab initio e, à data dos factos não podia ser considerado pelos usos como elemento integrante da retribuição do trabalhador.

V - A atribuição do subsídio de equiparação foi feita como uma regalia conjuntural, não de um direito adquirido ad eternum, como a Sentença recorrida tende a defender.

VI - Mais invoca o Recorrente que deverá ser declarada a indeterminabilidade do objecto da medida de atribuição definitiva do subsídio de equiparação e consequentemente a nulidade da respectiva declaração.

VII - Para tanto, baseia-se o Recorrente no escopo do artigo 280.º do Cód. Civil em todo o seu âmbito jurídico e na actual Jurisprudência de que é exemplo o Acórdão do Supremo Tribunal de Justiça n.º 4/2001, publicado no DR-I série-A, de 8.3.2001, subscrito por 34 Conselheiros.

VIII - Em reforço do supra referido, o Recorrente esgrime no sentido de que a decisão a quo perante a matéria dada como assente, ficou aquém do que seria uma sentença justa, maxime determinando a nulidade da supra mencionada declaração de atribuição do subsídio de equiparação, IX - Porquanto, estão reunidas todas as condições para se considerar o objecto sub judice indeterminável, por estar dependente de terceiros e sem limites temporais.

X - Ora, razões imperiais e mesmo por força da lei, permitem concluir o quão atentatório que é uma cláusula de efeito ad eternum com um objecto indeterminável, dependente de terceiros e não dos próprios, resultando mesmo ope legìs como uma das limitações ao Princípio da Liberdade Contratual.

XI - De referir que o tribunal a quo não valorizou devidamente a disciplina do DL 553/80, de 21 de Novembro. De facto, estamos perante uma lex specialis que, estabeleceu o Estatuto do Ensino Particular e Cooperativo.

XII - Na verdade, aquele Decreto-Lei define rigorosamente os parâmetros dentro dos quais será legitimo ou não, garantir os direitos adquiridos, sempre que se tente uma aproximação entre a situação dos professores do ensino particular e dos do ensino público.

XIII - Tal seria efectuado de forma a proporcionar a correspondência de carreiras profissionais, mas com um limite: " ... na medida do possível...".

XIV - A decisão a quo assim não entendeu, mesmo sabendo que a lei foi cumprida sem prejudicar terceiros.

XV - O tribunal a quo deu o seu veredicto contrariando o Acórdão do STJ supra mencionado, contrariou uma lei especial, mormente o DL 553/80, de 21 de Novembro e, não atendeu ao que efectivamente está subjacente ao artigo 280.º do Cód. Civil.

XVI - Com efeito, houve efectivamente uma alteração significativa das circunstâncias entre a data de 1990 em que foi atribuído pelo Recorrente o subsídio de equiparação e a data de 2002 que corresponde ao período em que foi retirado o subsídio (sem prejuízo do montante total da retribuição), sem que tal alteração significativa (lei de 1999 com repercussão a partir de 2001). Tal alteração significativa das circunstâncias não prevista, nem era razoável prever, em 1990.

XVII - O referido na conclusão supra mencionada tem o seu enquadramento legal no artigo 437.º do Cód. Civil ex vi do artigo 252.º do mesmo diploma legal, pelo que haverá lugar a resolução da medida de atribuição do subsídio de equiparação.

XVIII - No que respeita à alteração superveniente das circunstâncias, ao contrário do decidido pelo Tribunal a quo, ante a matéria dada como assente e atendendo ao substrato do artigo 437.º do Cód. Civil, estão na verdade preenchidos todos os pressupostos daquele instituto.

XIX - Atendendo ao artigo 334.º do Cód. Civil em que está aflorada a figura do Abuso de Direito, conclui-se que pelas razões aduzidas nas Alegações e do que resulta da matéria dada como assente na decisão a quo, deverá proceder a tese do Recorrente.

XX - O direito que o recorrido se propôs exercitar excede, manifestamente, os limites impostos pela boa fé e pelos bons costumes. Desembocando em concreto, num venire contra factum proprium, o que integra o Abuso de Direito, com a consequente paralisação do respectivo exercício.

XXI - Do exposto, a decisão a quo jamais poderia ser condenatória nos precisos termos em que o foi.

O A. apresentou a sua alegação de resposta, pedindo que se negue provimento ao recurso.

A Exm.ª Sr.ª Procuradora-Geral Adjunta, nesta Relação, emitiu douto parecer no sentido de que o recurso não merece provimento.

Apenas a R. se posicionou quanto ao teor de tal parecer.

Recebido o...

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