Acórdão nº 0545151 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 29 de Março de 2006

Magistrado ResponsávelPINTO MONTEIRO
Data da Resolução29 de Março de 2006
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam, em audiência, no Tribunal da Relação do Porto: No Tribunal Judicial de Matosinhos, foram os arguidos B………., C………. e "D……….., Lda.", todos devidamente identificados nos autos a fls. 718, condenados: os arguidos B………. e C………., pela prática, cada um, de um crime de contrafacção, imitação e uso ilegal de marca, na forma continuada, p. e p., pelo artigo 264°, n.ºs 1 e 2, do Código da Propriedade Industrial, aprovado pelo D/L nº 16/95, de 24 de Janeiro, e actualmente, previsto e punido pelo artigo 324° do mesmo diploma, na redacção introduzida pela Lei n.º 36/2003, de 5 de Março, na pena de 70 dias de multa, à razão diária de €7,00; a arguida "D………., Lda.", pela prática do mesmo crime de contrafacção, na pena de 70 dias de multa, à razão diária de €15,00, nos termos do art.º 258° do CPI aprovado pelo DL 16/95 de 24/JAN, ora art.º 320° do CPI aprovado pelo D/L 36/2003 de 05.03.2003.

Inconformados com a decisão, recorreram os arguidos, tendo concluído a motivação nos termos seguintes: I - Foram os arguidos condenados pela prática de um crime de contrafacção, imitação e uso ilegal de marca, previsto e punido pelo art. 324.º do Código da Propriedade Industrial, na pena de 70 dias de multa, à razão diária de €7,00 para os primeiros e à razão diária de €15,00 para a terceira arguida e ainda nas custas criminais.

II - Dos autos e da audiência de julgamento não resultaram elementos suficientes para o tribunal poder dar por provados os factos como fez, havendo por isso manifesta insuficiência de prova e, por outro lado, a matéria dada por provada é também manifestamente insuficiente para a decisão condenatória, tendo ainda ficado efectivamente provados factos que, devida e concretamente valorados, deveriam ter levado o tribunal, necessariamente, a decidir de forma diferente, sendo estes os fundamentos legais do presente recurso (art. 410.º, n.º2, als. a) e b) do CPP).

III - Por isso, com o presente recurso, para além de se não conformarem com a decisão de direito e respectiva matéria, os arguidos pretendem impugnar expressamente a decisão proferida sobre matéria de facto.

IV - Os arguidos consideram que foram incorrectamente julgados os poontos de facto, a saber: - que os 169 relógios e 1210 estojos e porta-moedas apreendidos, foram importados pela arguida D………, Lda, representada pelos arguidos; - que os arguidos agiram de modo voluntário, livre, concertado e consciente; - que quiseram adquirir para a sociedade que representavam tal mercadoria o que fizeram, importando-a e colocando-a assim em circulação, bem sabendo que se tratava de mercadoria anómala, contrafeita e imitada; - que actuaram com intenção de obter para si benefícios ilegítimos.

V - Entendem os arguidos que não há nos autos qualquer prova, nem a mesma foi produzida em audiência de julgamento, relativamente a estes pontos de facto e que permita dá-los por provados.

VI - Os arguidos negaram que alguma vez tivessem encomendado qualquer mercadoria contrafeita e analisada a prova documental, nada permite retirar qualquer indício de que, naquelas encomendas e por ordem de qualquer dos arguidos, estivessem incluídas quaisquer mercadorias contrafeitas.

VII - A prova testemunhal produzida é totalmente omissa quanto a este ponto: ouvido na íntegra o registo magnético dos respectivos depoimentos, nenhuma testemunha afirma ou sequer insinua que os arguidos tenham encomendado mercadoria contrafeita.

VIII - De igual forma, nenhuma prova foi produzida ou consta dos autos de que, nesta encomenda, os arguidos tenham agido de forma concertada, livre e consciente para importar mercadoria contrafeita.

IX - Os arguidos, ao importarem a mercadoria contrafeita, não a colocaram em circulação.

X - As mercadorias foram detectadas na Alfândega, antes do seu desalfandegamento, tendo sido apreendidas, não chegaram à posse de nenhum dos arguidos para que qualquer um deles pudesse sequer tentar colocá-las no circuito comercial e à disposição de quem quer que fosse.

XI - O acto de importação não integra ou preenche o conceito de colocação em circulação e os arguidos tão pouco importaram, de forma voluntária, livre e consciente, qualquer mercadoria ou artigo contrafeitos.

XII - Verifica-se pois que há manifesta insuficiência de prova para a decisão de facto proferida, insuficiência esta que resulta da própria decisão ora recorrida e da fundamentação.

XIII - Com base na matéria dada por provada, o tribunal decidiu que "…temos de forma clara que os arguidos, com a sua apurada conduta se constituíram na autoria material de um crime de contrafacção, verificando-se os elementos objectivos e subjectivos do tipo legal." e "Deste modo, verifica-se o cabal preenchimento dos elementos objectivos e subjectivos do tipo de crime de contrafacção, na forma continuada, inexistindo quaisquer causas de exclusão da ilicitude, bem como de desculpação dos arguidos".

XIV - Os arguidos entendem que se verifica uma insuficiência manifesta da matéria de facto dada por provada para a decisão proferida e o tribunal erra totalmente na subsunção dos factos ao direito, interpreta erradamente a norma do art. 324.º do CPI e, ao condenar os arguidos fá-lo em clara violação desta mesma norma jurídica.

XV - Sempre com o devido respeito e salvo melhor opinião, parece aos arguidos que, perante os elementos e factos dados por provados e face ao tipo legal de crime em causa (art. 324.º do CPI), a decisão correcta é a de absolvição.

XVI - Esta norma pune o agente que venda, ponha em circulação ou oculte produtos contrafeitos, por qualquer dos modos e nas condições referidas nos artigos 321.º a 323.º e com conhecimento dessa situação.

XVII - São elementos objectivos do tipo legal as acções a desenvolver pelo agente para praticar o crime: vender, pôr em circulação ou ocultar produtos contrafeitos.

XVIII - Está provado que os produtos contrafeitos nunca chegaram a estar na posse de qualquer dos arguidos, que nunca tiveram sequer a possibilidade material de vender, pôr em circulação ou ocultar qualquer deles.

XIX - Há por isso uma absoluta impossibilidade física e material da prática de qualquer das acções tipificadoras do crime.

XX - Quanto ao elemento subjectivo, a disposição legal é clara e expressa: o agente tem de praticar alguma das acções previstas de vender, pôr em circulação ou ocultar produtos contrafeitos, com conhecimemto dessa situação.

XXI - As mercadorias foram encomendadas previamente em Hong Kong, foram fabricadas na China, país de onde provinham e onde foram carregadas nos contentores e nenhum dos arguidos esteve presente ou controlou o carregamento dos contentores.

XXII - Nenhum dos arguidos teve conhecimento de que dentro dos contentores se encontravam produtos contrafeitos e praticaram nenhuma das acções previstas, com conhecimento de que se tratava de produtos contrafeitos.

XXIII - A douta senteça decidiu que a conduta dos arguidos preenche os elementos objectivos e subjectivos daquele tipo legal, tendo-se por isso constituído como autores materiais do crime de contrafacção, muito embora não diga expressa e concretamente porquê e como esse preenchimento ocorre.

XXIV - Em cumprimento expresso do disposto no n.º2 do art. 412.º do CPP, parece aos arguidos que o tribunal entende ou interpreta aquela norma no sentido de que o acto de importação de mercadorias configura ou corresponde de alguma forma às acções de "quem vender, puser em circulação ou ocultar produtos contrafeitos…".

XXV - Sempre com o devido respeito e salvo melhor opinião, esta interpretação é errada e carecida de fundamento, uma vez que a importação de mercadorias, que nunca chegaram a estar na posse dos arguidos, não cabe em nenhuma das acções taxativamente previstas no tipo legal.

XXVI - Assim, a douta sentença ora recorrida, para além de violadora do disposto no art. 324.º do CPI, de errada e profundamente injusta, é ainda altamente penalizadora para os arguidos, cidadãos estrangeiros residentes em Portugal há muitos anos, com vidas exemplares a todos os títulos, que agora se vêem condenados sem qualquer fundamento e sem terem cometido qualquer acto ilícito.

XXVII - Sendo certo que a ausência de antecedentes criminais no registo criminal é muito relevante para os arguidos, uma vez que têm nacionalidade indiana, residem/trabalham em Portugal há cerca de 25 anos e os seus filhos já possuem nacionalidade portuguesa.

XXVIII - Pelo que aspiram também eles obter a nacionalidade portuguesa, para o que é determinante a inexistência de antecedentes no respectivo registo criminal.

Nos termos do disposto no n.º4 do art. 412.º do CPP, uma vez que a prova produzida em audiência de julgamento foi gravada, há lugar à transcrição daquelas que os arguidos entendem impor decisão diversa da ora recorrida.

Tal como ficou expresso na motivação do recurso, os arguidos entendem que dos depoimentos das testemunhas E………., F………., G………., H………. e I………., sendo correctamente, (sic) demonstram a incorrecção do julgamento da matéria de facto e impõem uma decisão diversa.

X X XNa 1.ª instância respondeu o M.º P.º pronunciando-se pelo não provimento do recurso, sendo no mesmo sentido o parecer do Ex.mº Procurador Geral Adjunto neste tribunal.

Cumprido o disposto no n.º2 do art. 417.º do C. P. Penal, responderam os arguidos reiterando a posição já assumida na motivação do recurso.

Foram colhidos os vistos legais.

Procedeu-se à audiência de julgamento de harmonia com o formalismo legal, como consta da respectiva acta.

Cumpre decidir.

X X XNa 1.ª instância procedeu-se à gravação da prova oralmente produzida na audiência de julgamento, que se encontra transcrita, pelo que, nos termos dos arts. 364.º, n.º1, e 428.º, n.º2, ambos do C. P. Penal, este tribunal conhece de facto e de direito.

X X XTendo em conta as conclusões da motivação do recurso e que estas delimitam o seu objecto, são três as questões suscitadas pelos arguidos a merecer apreciação, a saber: a) a sentença padece dos vícios da insuficiência para a decisão da matéria de facto provada e da...

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