Acórdão nº 0552581 de Court of Appeal of Porto (Portugal), 23 de Maio de 2005 (caso NULL)

Magistrado ResponsávelFONSECA RAMOS
Data da Resolução23 de Maio de 2005
EmissorCourt of Appeal of Porto (Portugal)

Acordam no Tribunal da Relação do Porto "B.........., Ldª" intentou, em 17.2.2003, pelos Juízos Cíveis do Porto - .. Juízo - acção declarativa de condenação, com processo sumário, contra: C..........

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Pedindo a condenação da Ré a pagar-lhe a quantia de € 14.405,00 acrescidos de juros de mora, à taxa legal, vencidos desde a citação e até integral pagamento da dívida e acrescida da quantia anual de € 409,45 desde 01.03.2003 e até efectivo pagamento.

Como fundamento alega que: - em 01.03.1999, entre as partes foi celebrado um contrato de fornecimento de café através do qual a Ré se obrigou a adquirir 2.700 kg de Café .........., lote .........., no prazo de 8 anos, em quantidades mínimas mensais de 28 kg nos termos e condições previstas no contrato junto aos autos; - que a partir de Setembro de 2002, a Ré passou a não cumprir os termos do contrato, tendo a A. procedido à resolução do contrato por carta registada de 19.11.2002, sendo a quantia peticionada nos autos a indemnização prevista no nº 1 da cláusula 8º bem como o valor dos kg de café a que estava obrigada a adquirir.

Citada, a Ré contestou aceitando a assinatura do contrato mas que, contudo, foram os funcionários da Autora que fizeram uma estimativa do consumo mensal do café bem como o tipo e qualidade de café que deveria ser comercializado e aconselharam o tipo de equipamento que seria cedido, respectivas especificações e preço bem como a quantidade de café que seria necessária adquirir para compensar o investimento efectuado e que só a inexperiência do Réu o levou a aceitar.

Mais alega que durante a vigência do contrato sempre a Ré adquiriu quantidade inferior de café ao acordado, nunca a Autora tendo reagido negativamente a tal situação.

Mais alega que o contrato junto aos autos está ferido de nulidade na medida em que apenas contempla obrigações e penalizações para o caso de incumprimento da Ré, designadamente, da clausula nº8 atenta a desproporção dos encargos aí previstos para a A. e Ré.

Conclui alegando que aceita uma redução do contrato mas nunca uma resolução do contrato uma vez que em nada contribui para o facto de haver uma quantidade de café adquirida menor do que a estipulada no contrato.

Respondeu a Autora, alegando que o contrato foi livremente negociado com a Ré e que a cláusula penal é perfeitamente válida.

*** A final foi proferida sentença que: "Julgo a presente acção totalmente procedente porque provada e:

  1. Condeno a Ré a pagar à Autora a quantia de € 14.405,00 (catorze mil quatrocentos e cinco euros), acrescidos de juros de mora, desde a citação, à taxa legal até efectivo e integral pagamento, acrescido da quantia anual de € 409,45 desde 01.03.2003 até efectivo pagamento." *** Inconformada recorreu a Ré que, alegando, fls.250/259, formulou as seguintes conclusões: A) - Consta dos autos, a fls. 119 a 128, o Douto Acórdão do Tribunal da Relação que decidiu o primeiro recurso interposto, entre outras, as seguintes considerações: - "Se a Autora apesar do clausulado no contrato, criou na Ré a convicção de que, afinal, nenhum problema advinha por não comprar 28 kg de café por mês, a pretensão de que o fizesse a partir de Setembro de 2002 integra uma quebra da boa fé, na modalidade de "venire contra factum proprium".

B) A Douta Sentença ora em recurso continuou a dar como assente que: - a Autora enviou à Ré as cartas juntas como sendo os docs. fls. 2 a 5, com os dizeres e nas datas nelas referidas; - que a Ré apenas tinha consumido até Setembro de 2002, 215 kgs de café; - que a Ré durante a vigência do contrato nunca tinha adquirido 28 kgs de café.

C) Deve o espírito da boa fé ser como que um ar que deve circular em toda a vida do contrato e pode definir-se o "venire contra factum proprium" como "o exercício de uma posição jurídica contrária ao comportamento anteriormente assumido", logo, falar-se dele quando há uma contradição directa entre a situação jurídica resultante de um "factum proprium" e um segundo comportamento.

D) A Autora nunca se importou com o facto de a R. nunca adquirir uma quantidade de café igual ou sequer aproximada da quantidade contratada, pois antes nunca reagiu a esta situação como não se importou que a R. tivesse cedido o estabelecimento e, com ele, tivesse transferido as obrigações decorrentes de tal cessão, entre as quais a de continuar a ser comprado café, o que aconteceu.

E) Ao ter este comportamento permissivo - o factum proprium - o qual fez criar na Ré a convicção de que a compra de café em quantidades inferiores ao contratado não era problema tinha que agir - o segundo comportamento - de acordo e não em contradição com o primeiro comportamento isto é: - não podia em Setembro de 2002, data em que tomou conhecimento da cessão de exploração, vir dizer que resolvia o contrato porque tinha passado a haver uma violação do contrato, que sempre houvera, mas que nunca tinha levado a nenhuma consequência.

F) Esta posição defendida no Douto Acórdão da Relação do Porto de 05 de Fevereiro de 2004, o qual consta aliás dos autos por ter sido tirado em anterior recurso da R., tem que continuar a valer para afirmar a sem razão da Autora para resolver o contrato dos Autos.

G) Houve, por parte da A., quebra da boa fé que deve existir e perpassar durante toda a vida do contrato, desde as negociações com vista à celebração do mesmo até ao termo, aconteça ela por que meio for, da relação contratual, na modalidade de venire contra factum proprium e a consequência a extrair desta violação das regras da boa fé por parte da Autora tem que levar à absolvição da R. de todo o peticionado, o que só pode acontecer pela revogação da Douta Sentença em recurso, o que se visa como o presente recurso.

H) Na Douta Sentença de fls. 34 e ss. dos Autos e quando o M.mº Juiz se pronunciou então sobre a validade (ou não) das cláusulas do contrato em crise nos Autos foi dito: - "Considerando... o teor da cláusula nona, parece-mos óbvia a manifesta desproporção entre o valor da cláusula e os danos a cobrir" - (essa manifesta desproporção) "justificativa, por isso, da nulidade" - "Sendo completamente absurdo que fique obrigado ainda a restituir o valor inicial acrescido de uma indemnização anual de 10% desse valor desde a data da assinatura do contrato e até integral pagamento" - "Seria um verdadeiro locupletamento por parte da A. em face do incumprimento do cliente" I) A M.mª Juiz "a quo" não pode, salvo o devido respeito, porque não houve alteração de qualquer pressuposto, nem alteração do que já então era matéria assente, deixar de considerar, como faz na sentença em recurso, que a condenação da A. no montante peticionado a este título - indemnização prevista na 1a parte da clausula relativa ao equipamento cedido - - seria um verdadeiro locupletamento por parte da Autora em face do incumprimento da R.

- e que seria completamente absurdo que a R. ficasse ainda obrigada a restituir o valor inicial acrescido de uma indemnização anual de 10% desse valor desde a data da assinatura de contrato e até integral pagamento.

J) Quanto à classificação de algumas cláusulas do contrato como sendo cláusulas gerais, com disciplina própria, nada resulta da matéria dada como provada que assim não seja.

L) Se é verdade que resulta provado que a R. terá estado presente nas negociações do contrato, não resulta que tenha tido capacidade para impor a sua vontade no que tange às Cláusulas indemnizatórias para o caso de incumprimento por parte do cliente, a R., pois nenhuma se prevê para o caso de incumprimento por parte da Autora.

M) Não pode merecer aceitação por parte da R., salvo o devido respeito, a argumentação de que estas cláusulas não poderão ser consideradas excessivas por não se ter feito prova do excesso, pois basta fazer algumas contas, com os dados constantes do contrato, para se aferir o excesso de contrapartidas e se revelar a desproporção de obrigações em caso de incumprimento por parte da R., e o contrato só trata deste.

N) Esta desproporção leva à nulidade de tais cláusulas do contrato junto aos autos, designadamente, quanto ao ali clausulado sob o n°8 é que a indemnização pretendida pelo equipamento é de € 5.732,35, e o equipamento terão custado não se sabe quanto, mas terá sido avaliado € 4.094,55 a que acrescerá, a quantia de € 8.672,65 ainda a título de indemnização.

Ou seja a um...

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