Acórdão nº 3/03.3JACBR.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 14 de Julho de 2010

Magistrado ResponsávelOLIVEIRA MENDES
Data da Resolução14 de Julho de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: RECURSO PENAL Decisão: PROVIDO Sumário : I - A decisão recorrida – que procede ao cúmulo jurídico de penas dos arguidos – é totalmente omissa quanto aos factos dados como provados nos diversos processos relativos aos crimes em concurso, bem como no que concerne aos factos atinentes às condições pessoais, familiares e sociais de cada um dos arguidos e à sua personalidade.

II - De acordo com a jurisprudência maioritária do STJ, a sentença referente a um concurso de crimes de conhecimento superveniente deverá ser elaborada, como qualquer outra sentença, tendo em atenção o disposto no art. 374.º do CPP, pois a lei não prevê nenhum desvio a esse regime geral.

III -Para além disso, a punição do concurso superveniente não constitui uma operação aritmética ou automática, antes exige um julgamento (art. 472.º, n.º 1, do CPP), destinado a avaliar, em conjunto, os factos, na sua globalidade, e a personalidade do agente, conforme dispõe o art. 77.º, n.º 1, do CP.

IV -Assim, o julgamento do concurso de crimes constitui um novo julgamento, destinado a habilitar o tribunal a produzir um juízo autónomo relativamente aos produzidos nos julgamentos dos crimes singulares, pois agora se aprecia a globalidade da conduta do agente e a sua personalidade referenciada a essa globalidade. Esse juízo global exige uma fundamentação própria, quer em termos de direito quer em termos de factualidade. Por isso, a sentença de um concurso de crimes terá de conter uma referência aos factos cometidos pelo agente, não só em termos de citação dos tipos penais cometidos, como também de descrição dos próprios factos efectivamente praticados, na sua singularidade circunstancial.

V - Aceita-se que essa referência seja sucinta, uma vez que os factos já constam desenvolvidamente das respectivas sentenças condenatórias, mas tal referência sintética não deixa de ser essencial, pois só ela, dando os contornos de cada crime integrante do concurso, pode informar sobre a ilicitude concreta dos crimes praticados (que a mera indicação dos dispositivos legais não revela), a homogeneidade da actuação do agente, a eventual interligação entre as diversas condutas, enfim, a forma como a personalidade deste se manifesta nas condutas praticadas e na conduta global.

VI - A sentença do concurso constitui uma decisão autónoma, e por isso ela tem de conter todos os elementos da sentença, e habilitar quem a lê, as partes ou qualquer outro leitor, a apreender a situação de facto ali julgada e compreender a decisão de direito. É essa a função de convicção (e de legitimação) que a sentença deve cumprir. E se não cumpre (como no caso dos autos, em se que omite completamente a referência aos factos concretamente perpetrados, bem como às condições pessoais, familiares e sociais dos arguidos e à sua personalidade, a decisão proferida pelo tribunal recorrido também não cumpre o imposto pelo n.º 2 do art. 374.º, sendo por isso nula, por força do art. 379.º, n.º 1, al. a), ambos do CPP.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça No âmbito do processo comum com intervenção do tribunal colectivo n.º 3/03.3JACBR, do 2º Juízo da comarca de Santa Comba Dão, tendo em vista o conhecimento superveniente de concurso de crimes, foram os arguidos AA, BB e CC, com os sinais dos autos, condenados nas seguintes penas: a) AA, nas penas conjuntas de 7 anos de prisão e 10 anos de prisão; b) BB, na pena de 5 meses de prisão e na pena conjunta de16 anos de prisão; c) CC, nas penas conjuntas de 10 anos de prisão e 6 anos e 6 meses de prisão e 180 dias de multa à taxa diária de € 2,00.

Os arguidos interpuseram recurso para este Supremo Tribunal de Justiça.

Nas motivações apresentadas e respectivas conclusões suscitam as seguintes questões: - Inclusão de todas as penas parcelares numa só pena única ou conjunta, por todas elas se encontrarem numa relação de concurso; - Redução das penas únicas ou conjuntas cominadas, por haverem sido incorrectamente determinadas.

Na contra-motivação o Exmo. Procurador da República pugna pela confirmação da decisão recorrida.

Igual posição assumiu nesta instância o Exmo. Procurador-Geral Adjunto.

Colhidos os vistos, cumpre decidir.

Os recorrentes, como já se deixou consignado, submetem à apreciação deste Supremo Tribunal o conhecimento de duas questões, a primeira atinente à inclusão de todas as penas pelas quais foram condenados numa só pena conjunta, sob a alegação de que todas elas se encontram numa relação de concurso, a segunda relativa à medida das penas conjuntas que lhes foram cominadas, com o fundamento de que se mostram incorrectamente determinadas, devendo ser reduzidas.

Questão que oficiosamente se suscita é a da nulidade da decisão de facto proferida por total omissão relativamente aos factos perpetrados pelos arguidos que se encontram subjacentes aos crimes em concurso, bem como aos factos respeitantes às suas condições pessoais e à sua personalidade.

É do seguinte teor a decisão proferida sobre a matéria de facto - (1): I - O arguido AA, melhor identificado nos autos, por factos de 31/12/2002, foi condenado nos presentes autos de P.C.C.3/03.3JACBR por acórdão de 12/3/2009, transitado em julgado, nas seguintes penas: - como co-autor de um crime de furto qualificado , p. e p. pelos arts. 203º,nº1 e 204º,nº1,al.a), do C.Penal, na pena de 2 anos de...

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