Acórdão nº 63/10.0YFLSB de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 09 de Setembro de 2010

Magistrado ResponsávelSERRA BAPTISTA
Data da Resolução09 de Setembro de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE Sumário : 1.º - É escopo principal da responsabilidade civil do produtor a protecção adequada e eficaz do público utente ou consumidor em geral, exposto ao perigo e ao dano cuja fonte são os defeitos dos produtos postos em circulação.

  1. - O DL 383/89, de 6 de Novembro consagra o carácter objectivo da responsabilidade do produtor.

  2. - Neste regime – no da responsabilidade civil do produtor – a prova do defeito - tal como do dano e do nexo de causalidade entre aquele e este - cabe ao lesado.

  3. - Mas o lesado já não precisa de demonstra a existência do defeito no domínio da organização e risco do produtor no momento em que o produto foi posto por este em circulação. Esta existência é presumida por lei, cabendo ao produtor ilidi-la, convencendo o Tribunal da probabilidade ou razoabilidade da inexistência do defeito no momento da entrada do produto em circulação.

    1. – Entende-se adequada à satisfação do dano não patrimonial consistente na cegueira de um olho, pelo rebentamento de uma garrafa de cerveja defeituosa na mão da vítima, com 49 anos, a que acrescem dores, angústias, internamento hospitalar e intervenção cirúrgica, a indemnização de € 45 000.

      Decisão Texto Integral: ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA: AA veio intentar acção, com processo ordinário, contra S... – SOCIEDADE CENTRAL DE CERVEJAS E BEBIDAS, S. A. (antes, C.......... – CENTRAL DE CERVEJAS, S. A.), COMPANHIA DE SEGUROS ................. e ............. SUPERMERCADOS, LDA, pedindo a condenação solidária destes a pagar-lhe de indemnização: a) 75.000.000$00, relativamente aos danos não patrimoniais; b) 94.429$00 pelos danos patrimoniais que melhor descreve, acrescidos da quantia que se liquidar ulteriormente; c) 8.894.160$00 relativos à redução da capacidade de ganho.

      Alegando, para tanto, e em suma: Adquiriu, na terceira ré, uma garrafa de cerveja, proveniente da primeira Já em casa, aquela rebentou, ferindo-a com gravidade, no olho direito que vazou e ficou irremediavelmente cego.

      A segunda ré havia assumido, por contrato de seguro com a 1ª, a responsabilidade respeitante a danos emergentes da fabricação dos seus produtos.

      Contestaram as 1ª e 2ª rés, sustentando, no essencial que o rebentamento da garrafa não foi espontâneo, antes se devendo a impacto de objecto exterior a ela, de sorte que não lhes deve ser assacada responsabilidade.

      Na réplica, a autora manteve as anteriores posições. E requereu a intervenção de S....... B......., S. A. por ter sido o fabricante da garrafa.

      Admitida a intervenção, este contestou, sustentando, também no essencial, que a quebra da garrafa se deveu a impacto de objecto duro.

      Foi proferido o despacho saneador, tendo sido fixados os factos tidos por assentes e organizada a base instrutória.

      Realizado o julgamento, foi decidida a matéria de facto da base instrutória pela forma que do despacho junto de fls 1269 a 1278 consta.

      Foi proferida a sentença que, julgando a acção improcedente, absolveu as rés, bem como a interveniente, do pedido.

      Inconformada, veio a autora interpor recurso de apelação para o Tribunal da Relação de Lisboa onde, por acórdão de 14/10/2008, se decidiu: “Julgar parcialmente procedente a apelação e alterar a indicação da matéria de facto provada e não provada apenas nos termos enunciados no ponto 4.2.6. do presente acórdão, para o qual se remete, revogar, na íntegra, o decreto judicial absolutório contido na sentença recorrida, e, em sua substituição, condenar solidariamente as Rés "S... – SOCIEDADE CENTRAL DE CERVEJAS E BEBIDAS, S.A.”, (antes C.............. Central de Cervejas, S.A.) e COMPANHIA DE SEGUROS ............. no pagamento à Autora das quantias a seguir indicadas, absolvendo as demais demandadas dos pedidos contra elas formulados nestes autos pela demandante: 1 - € 45.000.00, a título de danos morais, 2 - € 44.834,89, a título de danos patrimoniais já liquidados, sendo € 44.363,89 pela perda da capacidade de ganho sofrida peta Autora, 3 - a que for apurada em execução de sentença, correspondente ao valor dos tratamentos necessários à manutenção da estabilidade do estado de saúde da Autora que esta tinha, na parte do seu corpo afectada pelo sinistro, no momento da alta (16 de Setembro de 1998), 4 - os juros de mora vencidos e vincendos sobre os montantes referidos nos três números anteriores, à taxa supletivamente fixada por lei para os credores que não são empresas comerciais singulares ou colectivas, e contados desde a data da citação da última das Rés condenadas até integral pagamento desses valores." Agora irresignadas, vieram as rés ........... e SOCIEDADE CENTRAL DE CERVEJAS pedir revista para este Supremo Tribunal de Justiça, onde, por acórdão de 4/6/2009, se ordenou a baixa do processo ao Tribunal da Relação de Lisboa para, se possível com os mesmos senhores Desembargadores, se decidir a matéria de facto, tomando a necessária posição sobre o perguntado nos nºs 47.º e 65.º.

      Na Relação, em 20/10/2009, foi proferido novo acórdão, no qual, julgando-se parcialmente procedente a apelação, se decidiu: a) alterar a indicação da matéria de facto provada e não provada apenas nos termos enunciados no ponto 4.1.6. do presente acórdão, para o qual se remete, e b) revogar o decreto judicial absolutório contido na sentença recorrida, e, em sua substituição, condenar solidariamente as Rés "....... – S........ C.......B......, S.A.”, (antes C...............C.............. C, S.A.) e COMPANHIA DE SEGUROS ............ no pagamento à Autora das quantias a seguir indicadas, absolvendo as demais demandadas dos pedidos contra elas formulados nestes autos pela demandante: 1 - € 45.000.00, a título de danos morais, 2 - € 44.834,89, a título de danos patrimoniais já liquidados, sendo € 44.363,89 pela perda da capacidade de ganho sofrida peta Autora, 3 - a que for apurada em execução de sentença, correspondente ao valor dos tratamentos necessários à manutenção da estabilidade do estado de saúde da Autora que esta tinha, na parte do seu corpo afectada pelo sinistro, no momento da alta (16 de Setembro de 1998), 4 - os juros de mora vencidos e vincendos sobre os montantes referidos nos três números anteriores, à taxa supletivamente fixada por lei para os credores que não são empresas comerciais singulares ou colectivas, e contados desde a data da citação da última das Rés condenadas até integral pagamento desses valores." De novo irresignadas, vieram as rés e novo irresignadas, vieram as rés SOCIEDADE CENTRAL DE CERVEJAS e A.....E......pedir revista para este Supremo Tribunal de Justiça, formulando aquela primeira ré, na sua alegação, as seguintes conclusões: 1ª - Enferma o Acórdão recorrido de um vício de nulidade, nos termos do disposto na alínea c) do artigo 668.° do Código de Processo Civil, por manifesta e incontornável contradição entre a resposta do Tribunal da 1ª Instância - não alterada pelo Tribunal a quo - ao quesito 75.° da Base Instrutória e a decisão do Tribunal Recorrido, no sentido de responsabilizar a ora Recorrente pelos danos suportados pela Autora, isto porquanto a factualidade plasmada na resposta do Tribunal ao artigo 75.° da Base Instrutória sempre suscitaria a aplicabilidade da alínea b) do artigo 5.° do Decreto-Lei n.º 383/89 e, em concomitância, a desresponsabilização da Recorrente pelos danos sofridos pela Recorrida, nulidade que se requer seja conhecida e determine a reversão da decisão a final proferida pelo Tribunal da Relação de Lisboa, sendo esta substituída pela decisão anteriormente proferida pelo Tribunal de 1ª Instância, nos termos e para os efeitos previstos no n.º 2 do artigo 721.° e no artigo 731.° do Código de Processo Civil.

    2. - O Tribunal Recorrido, ao alterar, nos termos em que o fez, a decisão do Tribunal de 1ª Instância, e para esse efeito, secundou depoimentos pertinentes, objectivos e rigorosos como foram aqueles prestados pelas testemunhas Engenheiros BB, CC, DD, EE, FF, GG, HH, cuja razão de ciência se encontra exarada em acta da sessão de julgamento do Tribunal de 1ª Instância e que, atenta a sua completude e solidez, estiveram na base dos factos considerados como provados por esse mesmo Tribunal.

    3. - Preterindo, por outro lado, a ciência e vinculatividade da prova documental e pericial considerada determinante pelo Tribunal de 1ª Instância para a corroboração dos quesitos 47.º e 65.º da Base Instrutória, sendo que de acordo com os dois relatórios periciais juntos aos autos o concreto rebentamento dos autos apenas se poderá imputar a um impacto que a garrafa tenha sofrido com um objecto duro.

    4. - Errou, assim, o Tribunal Recorrido ao secundar os sobreditos elementos probatórios e ao atribuir eficácia e força probatória suficiente para alterar a resposta do Tribunal de 1ª Instância aos quesitos 47.º e 65.º da Base Instrutória ao depoimento de uma testemunha que, não só não tem qualquer experiência e conhecimento técnico-científico sobre a matéria (e muito menos o teria no decurso de uma situação que se pressupõe de alguma aflição como a retratada nos autos) como apresenta uma proximidade inquestionável com a Autora (sendo sua filha!).

    5. - Acresce que o Tribunal Recorrido ignorou por completo o disposto na alínea b) do artigo 5.º do Decreto-Lei n.º 383/89, de 6 de Novembro, que possibilita ao produtor demonstrar a sua "desculpabilidade" na hipótese de ser demonstrada a inexistência de qualquer defeito aquando da entrada em circulação do produto. Tal circunstância - não obstante se encontrar efectivamente corroborada em resposta, não alterada, ao quesito 75.º da Base Instrutória - jamais poderia ser apurada no momento do rebentamento da garrafa testemunhado pela testemunha para o efeito invocada pelo Tribunal Recorrido -, mas sim no momento da actividade da Recorrente e do seu término, com a consequente colocação no mercado do produto, razão peia qual não se compreende a falaciosa asserção do Tribunal Recorrido no sentido de desvalorizar os depoimentos prestados pelas...

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