Acórdão nº 361/09 de Tribunal Constitucional (Port, 09 de Julho de 2009

Magistrado ResponsávelCons. Pamplona Oliveira
Data da Resolução09 de Julho de 2009
EmissorTribunal Constitucional (Port

ACÓRDÃO N.º 361/2009

Processo n.º 98/09

  1. Secção

Relator: Conselheiro Carlos Pamplona de Oliveira

ACORDAM NA 1ª SECÇÃO DO TRIBUNAL CONSTITUCIONAL

  1. Relatório

    1. Por sentença de 14 de Novembro de 2008, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra julgou totalmente procedente a impugnação judicial deduzida por A., S.A. contra o acto de liquidação da taxa de regulação e supervisão efectuada pela Entidade Reguladora para a Comunicação Social (ERC), relativa ao ano de 2007, incidente sobre os operadores de comunicação social da categoria de televisão, por considerar que a referida taxa prevista na alínea a) do n.º 3, do artigo 3.º e artigo 4.º do Regime de Taxas da ERC (Anexo I do Decreto-Lei n.º103/06, de 7 de Junho) “ao ter sido criada pelo Governo sem autorização legislativa da Assembleia da República, encontra-se ferida de inconstitucionalidade, por violação do princípio da legalidade tributária expresso nos art.ºs 165.º, n.º 1, alínea i), e 103.º, n.ºs 2 e 3, da Constituição da República Portuguesa.”

    Diz-se na sentença, para o que agora releva, o seguinte:

    “ [...]

    Foi o Decreto-Lei n.º 103/2006, de 7 de Junho, que aprovou o Regime de Taxas da ERC, que estabeleceu um sistema de taxas tripartido: a taxa de regulação e supervisão, a taxa por serviços prestados e a taxa por emissão de títulos habilitadores.

    No caso colocado à consideração do tribunal está em causa a denominada “taxa” de regulação e supervisão prevista no art. 3º, nº 3, al. a), dispondo o art. 4º sobre a epígrafe “Taxa de regulação e supervisão”:

    “1 - Ao abrigo da alínea b) do artigo 50.º e do n.º 1 do artigo 51.º dos Estatutos da ERC - Entidade Reguladora para a Comunicação Social, aprovados pela Lei n.º 53/2005, de 8 de Novembro, a taxa de regulação e supervisão visa remunerar os custos específicos incorridos pela ERC - Entidade Reguladora para a Comunicação Social no exercício da sua actividade da regulação e supervisão contínua e prudencial.

    2 - Estão sujeitas à taxa de regulação e supervisão todas as entidades que prossigam, sob jurisdição do Estado Português, actividades de comunicação social, sendo o quantitativo da taxa calculado em conformidade com a categoria em que se inserem e com a subcategoria de intensidade reguladora necessária.”

    Importa pois proceder à qualificação jurídica do tributo denominado taxa de regulação e supervisão da ERC, sendo certo que é hoje em dia pacificamente aceite pela doutrina e jurisprudência que a circunstância do legislador ter qualificado determinada figura jurídica como taxa não é relevante, devendo antes verificar-se se substancialmente ela se reconduz a essa figura ou se se trata de um imposto, ou como defendem certos autores como um “tertium genus”.

    A resposta a dar a esta questão torna-se necessária para se aferir da constitucionalidade das normas que enquadram a criação da taxa de regulação e supervisão, face ao disposto nos artigos 165.º, n.º 1, alínea i), e 103.º, n.ºs 2 e 3, da Constituição.

    De acordo com estes normativos constitucionais, a criação de impostos, bem como a definição dos seus elementos essenciais (incidência, taxa, benefícios fiscais e garantias dos sujeitos passivos) são matéria da reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República, só podendo os mesmos ser estabelecidos por lei da Assembleia da República ou por decreto-lei do Governo por aquela autorizado.

    Vejamos.

    O conceito de taxa tem sido alvo de ampla discussão doutrinal e jurisprudencial, encontrando-se hoje definidos, com suficiente base dogmática, os seus elementos essenciais.

    A título de exemplo, fazendo apelo à fundamentação constante de outras decisões, cita-se o douto acórdão do Tribunal Constitucional, nº 68/2007:

    “Como se sabe, existe uma abundante jurisprudência constitucional sobre a distinção entre imposto e taxa (...). Para extremar a noção de ‘imposto’ constitucionalmente relevante da de ‘taxa’, o Tribunal tem-se socorrido essencialmente de um critério que pode qualificar-se como ‘estrutural’, porque assente na ‘unilateralidade’ dos impostos (...), admitindo ainda, porém, como factor adicional de ponderação, que se tome em consideração a ‘razão de ser ou objectivo das receitas em causa’, quer para recusar a certas receitas o carácter de imposto, quer como argumento ponderoso para afastar o carácter de taxa de uma dada prestação pecuniária coactiva (...).

    (...)

    Tanto na jurisprudência uniforme do Tribunal, como na orientação unânime da doutrina, um elemento ou pressuposto estrutural há-de, desde logo e necessariamente, verificar-se, para que determinado tributo se possa qualificar como uma ‘taxa’, qual seja o da sua ‘bilateralidade’: traduz-se esta no facto de ao seu pagamento corresponder uma certa ‘contraprestação’ específica, por parte do Estado (ou de outra entidade pública). Se tal não acontecer, teremos um ‘imposto’ (ou uma figura tributária que, do ponto de vista constitucional, deve, pelo menos, ser tratada como tal). (...) Se se não divisarem características de onde decorra a ‘bilateralidade’ da imposição pecuniária, nada mais será preciso indagar para firmar a conclusão de harmonia com a qual é de arredar a qualificação dessa imposição como ‘taxa’”

    De acordo com a natureza da contraprestação do estado ou de outro ente público, a própria lei no art. 4º, nº 2 da Lei Geral Tributária (LGT), autonomiza três situações que revestem a natureza de taxa: a prestação concreta de serviços públicos, a utilização de um bem do domínio público e a remoção de um obstáculo jurídico à actividade dos particulares.

    Face ao que ficou dito, como caracterizar o tributo impugnado nos presentes autos-

    A doutrina e a jurisprudência recentes têm afastado este tipo tributário da qualificação de taxa, em alguns casos aproximando-o da figura das contribuições financeiras a favor das entidades públicas, a que se refere designadamente o art.º 165.º, n.º 1, alínea i), da Constituição, que estabelece uma reserva relativa de competência legislativa da Assembleia da República quanto à “criação de impostos e sistema fiscal e regime geral das taxas e demais contribuições financeiras a favor das entidades públicas”.

    No parecer junto aos autos da autoria do Prof. Casalta Nabais conclui-se no sentido de que a taxa em causa está sujeita ao princípio da legalidade fiscal decorrente dos art.ºs 165.º, n.º 1, alínea i), e 103.º, n.ºs 2 e 3, da Constituição, conforme a seguir se transcreve:

    “A “taxa de regulação e supervisão” não responde cabalmente ao teste da bilateralidade, pois a sua instituição não se deve à necessidade de dar resposta a uma necessidade gerada directa ou indirectamente pelos operadores do sector, mas antes à satisfação de interesses gerais. (...) Com efeito, o legislador prevê como fundamento da taxa os “custos específicos incorridos pela ERC” no exercício da sua actividade de regulação e supervisão, sem concretizar devidamente o...

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