Acórdão nº 77/07.8GBACB.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 14 de Julho de 2010
Magistrado Responsável | GOMES DE SOUSA |
Data da Resolução | 14 de Julho de 2010 |
Emissor | Court of Appeal of Coimbra (Portugal) |
Tribunal da Relação de Coimbra 4 º Secção 17 A - Relatório: No âmbito do processo comum singular supra numerado do Tribunal Judicial da comarca de Alcobaça, sob acusação do ministério Público, foi a arguida MA filha de A e de MS nascida a … de 1965, em Lisboa, casada, professora, residente…. Marinha Grande, titular do Bilhete de Identidade n.º 730…, emitido em 2/…/2005, acusada da prática de: - um crime de ofensa à integridade física por negligência, previsto e punível pelo artigo 148.º, n.º 1 e 3, com referência à alínea d) do artigo 144.º todos do Código Penal; - uma contra-ordenação ao disposto no artigo 29.º, n.º 1 do Código da Estrada; - uma contra-ordenação ao disposto no artigo 21.º, B2 e punida pelo artigo 23.º, al. a) do Decreto Regulamentar do Código da Estrada.
****A final decidiu a tribunal recorrido: a) ─ absolver a arguida MA da prática da contra-ordenação ao disposto no artigo 29.º, n.º 1 do Código da Estrada; b) ─ condenar a arguida MA, na pena de 130 (cento e trinta) dias de multa, à taxa diária de € 8,00 (oito euros), pela prática de um crime de ofensa à integridade física por negligência, previsto e punível pelo artigo 148.º, n.º 1 do Código Penal.
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─ condenar a arguida pela prática da contra-ordenação ao disposto no artigo 21.º, B2 do Decreto Regulamentar do Código da Estrada, na coima de €150,00 (cento e cinquenta euros) e na sanção acessória de inibição de conduzir todo e qualquer espécie de veículo motorizado, pelo período de 6 (seis) meses; e no mais legal.
*A arguida, não se conformando com a decisão, interpôs o presente recurso peticionando que se lavre acórdão que revogue a sentença recorrida e a absolva do crime imputado e formulando as seguintes (transcritas) conclusões: 1) Deu o tribunal como provado que a atravessou a Avenida Rainha Santa Isabel, sem parar antes de entrar naquele cruzamento e sem ceder passagem ao ciclomotor conduzido pela ofendida C que transitava nessa Avenida, isto apesar de não ter dito, que viu e apesar da arguida ter negado tal facto.
2) O Tribunal a quo, deu como provado um facto, que afinal não se provou na produção de prova realizada em audiência e julgamento.
3) Mais, o tribunal deu como coerentes os depoimentos de CM, PA, quando sobretudo o de CL, foi tendencioso de modo a prejudicar a Arguida.
4) Ouvidas todas as testemunhas, nenhuma veio afirmar que a arguida, não parou no sinal de STOP.
5) A Arguida afirmou com firmeza e segurança que parou no sinal de stop, não só naquele dia, como todos os dias em que ali passa naquele local, bem como noutros.
6) À luz do princípio da investigação, os factos com relevo para a decisão, apesar da prova recolhida, não podem ser subtraídos à dúvida razoável do tribunal, também não podem ser considerados como provados.
7) No caso concreto, o Tribunal a quo, não teve isso em consideração, violando um dos princípios basilares do Direito Processual Penal, o princípio lN DUBlO PRO REU.
8) Por outro lado, o princípio que obriga o tribunal a reunir as provas necessárias à decisão, logo compreende que a falta dessas mesmas provas, não possa desfavorecer a arguida.
9) Vem ainda a arguida condenada na prática de uma contra ordenação, nos termos do disposto no artigo 21.°, B2 punida pelo artigo 23º alínea a) do Decreto Regulamentar do Código da Estrada.
10) Em primeiro lugar, o Código da Estrada, não tem nenhum Decreto Regulamentar, tem sim um Regulamento, o Regulamento do Código da Estrada, que por sinal é Decreto nº 39 987/54 de 22 de Dezembro, em que o artigo 21.° e 23 não têm qualquer aplicação.
11) Existe um Decreto Regulamentar que aprovou o Regulamento de Sinalização do Transito, o Decreto Regulamentar nº 22-A/98 de 1 de Outubro, onde efectivamente se enquadra o artigo 21.°, B2 punida pelo artigo 23.a alínea a).
12) A arguida não sabe afinal, qual a norma que violou e qual a sanção aplicada, pois para aplicação de uma pena ou sanção acessória, esta tem de estar codificada e estatuída, NULLUM CRIMEN SINE LEGE.
13) Deste modo, considera-se que o facto de a arguida ter sido condenada por uma norma que não existe, (Decreto Regulamentar do Código da Estrada), viola um dos requisitos do nº 2 do Artigo 374.° do C.P.P., configurando uma nulidade prevista na alínea a) do nº 1 do Artigo 379.° do C.P.P.
14) Ainda assim e caso assim não se entenda, admitindo apenas como mera hipótese académica, sempre se dirá que independentemente da actuação da arguida, o dever geral de cuidado também se aplica à ofendida e não somente à arguida, conforme bem refere o código da estrada, no nº 2 do artigo 29.°.
15) A arguida vinha também acusada da prática de uma contra ordenação, prevista no nº 1 do artigo 29 do Código da Estrada, decidiu o Tribunal a quo, absolver a arguida, defendendo para o efeito, que a obrigação de cedência de passagem imposta pela existência, de um sinal de paragem, obrigatória no cruzamento, prevista no artigo 21.° do Decreto Regulamentar, abrange necessariamente a obrigação de cedência de passagem imposta, pelo nº 1 do artigo 29 do Código da Estrada.
16) Salvo melhor opinião não se pode absolver a arguida da prática da contra ordenação, prevista no nº 1 do artigo 29 do Código da Estrada, porque esta é menos grave que a prevista no artigo 21. ° do Decreto Regulamentar.
17) Pelo contrário, deverá ser sempre aplicável a norma mais favorável à arguida, à luz dos princípios de direito penal, nomeadamente o da aplicação da lei mais favorável.
18) Andou muito mal o Tribunal a quo, sem ter qualquer prova que a arguida não parou no sinal de stop, aplicou o artigo 21.°, B2 punida pelo artigo 23.a alínea a) do Decreto Regulamentar Nº 22-A/98 de 1 de Outubro.
19) Quando muito e por mera hipótese académica poderia apenas admitir que a arguida poderia ter violado o dever de cedência de passagem disposto no n.01 do artigo 29 do Código da Estrada.
20) Nesse pressuposto, teria que aplicar a contra ordenação prevista no artigo 29.° nº 1 do Código da Estrada e não a contra ordenação prevista no artigo 21.°, B2 punida pelo artigo 23º alínea a) do Decreto Regulamentar Nº 22-A/98 de 1 de Outubro.
21) O que por si só tem consequências, pois ao invés de aplicar a contra ordenação prevista na alínea I) do artigo 146.° do Código da Estrada, teria que aplicar a alínea f) do artigo 145.° do Código da Estrada.
22) Neste ultimo caso, e tendo o Tribunal conhecimento que a arguida é professora primária, necessita do veículo que conduz quer para se deslocar para a escola onde exerce a sua profissão e para transportar os seus filhos.
23) O facto de à arguida não serem conhecidas outras infracções estradais.
24) Esta conjugação de factos, por si permitia ao tribunal, suspender a execução da sanção acessória nos termos dos nº 1 e 2 do Artigo 141º do Código da Estrada, o que se poderia considerar como uma decisão ponderada e que produziria efeitos em termos de prevenção.
Nestes termos e nos melhores de direito, deve ser revogada a douta sentença, e consequentemente ser a arguida ABSOLVIDA, caso assim não se entenda, deve a sanção acessória de inibição de condução ser suspensa nos termos dos nºs 1 e 2 do Artigo 141.° do Código da Estrada.
*Notificada da interposição de recurso e da sua admissão a Digna Procuradora junto do Tribunal de Alcobaça respondeu ao mesmo, pugnando pela sua improcedência.
Nesta Relação, o Exmº Srº Procurador-geral Adjunto emitiu douto parecer propugnando pela improcedência do recurso.
Observado o disposto no n.º 2 do art. 417º do Código de Processo Penal, o arguido não respondeu.
Foi efectuado o exame preliminar, colhidos os vistos legais e realizada conferência.
***B - Fundamentação: B.1.a) - Na sentença recorrida deram-se como provados os seguintes factos:
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No dia 16 de Novembro de 2006, cerca das 12,50 horas o veículo ligeiro de passageiros, matrícula …-LX, conduzido pela arguida MA seguia pela Avenida da Lagoa, área desta comarca, no sentido da Avenida da Lagoa – Estrada Nacional n.º 242.
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Por sua vez o ciclomotor matrícula 3-…– 55 – 65, conduzido por C circulava pela Av. Rainha Santa Isabel, sentido Pataias-Burinhosa.
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Ao chegar à intersecção de vias formadas pelas Avenidas da Lagoa e da Rainha Santa Isabel a arguida pretendeu atravessar o cruzamento e seguir em frente pela Estrada Nacional n.º 242, estrada esta paralela à Avenida Rainha Santa Isabel.
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Nesse cruzamento e para os veículos que seguem pela Avenida da Lagoa existe um sinal de Stop.
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No entroncamento com a Estrada Nacional 242 estava parado um outro veículo.
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A arguida atravessou a Avenida Rainha Santa Isabel, sem parar antes de entrar naquele cruzamento e sem ceder a passagem ao ciclomotor conduzido pela ofendida C que transitava nessa Avenida.
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Com a manobra descrita, a arguida impediu o prosseguir de marcha do ciclomotor matrícula 3-…-55-65, pela via por onde este circulava, vindo a este a embater no veículo conduzido pela arguida, no lado direito, parte dianteira deste; H) O embate deu-se depois da arguida ter ultrapassado o eixo da Avenida Rainha Santa Isabel.
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Com o embate a ofendida foi projectada cerca de 10 metros, vindo a...
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