Acórdão nº 4865/07.7TVLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Julho de 2010

Magistrado ResponsávelBARRETO NUNES
Data da Resolução07 de Julho de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE Sumário : I.

O contrato oneroso e sem limitação temporal, celebrado para a realização de duas rubricas, devidamente intituladas, a serem publicadas num jornal, integra um contrato de prestação de serviço inominado, que tem por objecto o resultado de um determinado trabalho intelectual, segundo a previsão do art. 1154º do Código Civil.

II.

Aos contratos de prestação de serviço que a lei não regula especialmente são extensíveis, com as necessárias adaptações, as disposições sobre o contrato de mandato.

III.

Nomeadamente, no que à revogação unilateral do contrato concerne é aplicável o art. 1172º do Código Civil, que prevê o direito a indemnização da outra parte, preenchidos que estejam algum ou alguns dos seus pressupostos.

IV.

Segundo a previsão da alínea c) do art. 1172º, basta o preenchimento de um dos seus requisitos para que contraente que revogue unilateralmente um contrato de prestação de serviço tenha a obrigação de indemnizar o contratado.

V.

A revogação de um contrato de prestação de serviço inominado, oneroso e sem limitação temporal, por parte do contraente, pelo qual se contrata alguém para realizar duas rubricas, devidamente intituladas, para determinado jornal, consistindo tais rubricas na elaboração de páginas com texto e imagens sobre beleza, cosmética e consumo, a primeira a publicar com a disponibilidade de espaço na revista e a segunda semanalmente, cabe na previsão da alínea c) do art. 1172º do Código Civil, por caber no seu segmento “determinado assunto”.

VI.

Com efeito, o conteúdo de um contrato com as características acabadas de enunciar, embora deixando à contratada liberdade e criatividade para a respectiva elaboração, apresenta balizas bem definidas, pré-determinadas pelos títulos e pelas matérias a tratar nas duas rubricas nele contempladas, sendo o que podemos classificar, de “determinado assunto”.

VII.

Quanto ao segmento “antecedência conveniente”, também previsto na alínea c) do art. 1172º, afigura-se-nos justa a comunicação da revogação do contrato em apreço com uma antecedência de 60 dias, que é um período de tempo razoável para o contratado poder reorganizar a sua vida.

VIII.

No que à referida alínea c) do art. 1172º concerne, a sua ratio é a tutela da confiança, já que nela se tutela o direito do contratado à retribuição do contrato, pois que um dos pressupostos da responsabilidade do contraente-revogante é que o contrato seja retribuído.

IX.

Nessa medida, com a revogação do contrato, ocorre prejuízo para o contratado, que se traduz na perda de retribuição a que tinha direito, devendo a indemnização colocá-lo na situação patrimonial que teria se o contrato de prestação de serviço não tivesse sido revogado.

X.

No que respeita à quantificação da indemnização são aplicáveis as disposições dos arts. 562º e seguintes do Código Civil.

XI.

No caso em apreço, em que o contrato teve uma duração de dois anos, se fossem aplicáveis as normas do Código do Trabalho, a indemnização seria a correspondente a 52 dias de trabalho, mais o equivalente em diuturnidades, havendo ainda que valorizar o facto de o contrato de prestação de serviço ter por objecto o resultado de um trabalho intelectual ou manual ao contrário do contrato de trabalho que apenas tem por objecto a simples prestação de uma actividade intelectual ou manual, sob a autoridade de outra pessoa.

XII. Consequentemente, pondo de parte cálculos rigorosos ou quaisquer outras fórmulas matemáticas, o Tribunal deve recorrer à equidade para quantificar o que entende por justa indemnização.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: I – Relatório AA instaurou, em 2 de Novembro de 2007, na 8.ª Vara Cível da Comarca de Lisboa, contra BB, Publicações, S.A.

, acção declarativa, sob a forma de processo ordinário, pedindo que a R. fosse condenada a pagar-lhe a quantia de € 4.500,00, acrescida da quantia mensal vincenda de € 1.500,00, até Maio de 2008, e dos juros de mora desde o vencimento das prestações ou, subsidiariamente, a pagar-lhe a quantia de € 16.500,00, acrescida dos juros de mora desde a citação.

Para tanto, alegou, em síntese, que, em Maio de 2003, celebrou com a R. um contrato de prestação de serviço, pelo prazo de doze meses, tendo por objecto a prestação de serviços de produção de conteúdos editoriais, mediante o pagamento de honorários, o qual foi sendo renovado; em Junho de 2007, a Ré fez cessar o contrato, quando o seu termo estava acordado para Maio de 2008, tendo assim direito a receber os honorários até essa data, os quais, na altura da cessação do contrato, correspondiam à quantia mensal de € 1.500,00.

Subsidiariamente, alegou ainda a revogação do contrato, sem o seu acordo, estando a Ré obrigada a indemnizá-la pelos prejuízos sofridos.

Contestou a Ré, alegando que o contrato invocado pela Autora já não se encontrava em vigor em Junho de 2007, sendo lícita a cessação do respectivo contrato, e a inexistência da obrigação de indemnizar, e concluindo pela sua absolvição do pedido.

Replicou ainda a Autora, concluindo como na petição inicial.

Realizada a audiência de discussão e julgamento, foi proferida sentença, que absolveu a Ré dos pedidos.

Não se conformando com a mesma, a Autora apelou, tendo a Relação de Lisboa negado provimento ao recurso e confirmado a decisão recorrida, com fundamento em que: (I) O contrato de prestação de serviço, mediante o qual alguém se obriga a elaborar páginas com texto e imagens sobre beleza, cosméticos e consumo, a publicar em jornal, não é um contrato para “determinado assunto”; (II) O prazo de dois meses é razoável como “antecedência conveniente”, para a revogação unilateral do contrato de prestação de serviço, com uma duração de dois anos; (III) Por isso, não se justifica o direito à indemnização pela revogação unilateral do contrato de prestação de serviço, invocado com fundamento nos dois últimos pressupostos previstos na alínea c) do art. 1172.º do Código Civil.

Persistindo no seu inconformismo, a Autora vem recorrer, agora de revista, para este Supremo Tribunal, delimitando o objecto do recurso às seguintes conclusões: “1. Estão verificados dois dos três requisitos previstos na alínea c) do art. 1172º do CC, a saber: a Autora foi contratada para determinado assunto e o contrato não foi revogado com a antecedência conveniente.

  1. A verificação de qualquer um destes requisitos confere à A. o direito de ser indemnizada pela denúncia do contrato de prestação de serviços.

  2. Relativamente ao ‘determinado assunto’ está o mesmo verificado porque a recorrente prestava os seus serviços no jornal para...

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