Acórdão nº 476/99 P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Junho de 2010

Magistrado ResponsávelSEBASTIÃO PÓVOAS
Data da Resolução29 de Junho de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA Sumário : 1.O recurso para o Supremo Tribunal de Justiça – e salvo situação do artigo 725.º do Código de Processo Civil – destina-se a impugnar o Acórdão da Relação e a argumentar contra os seus fundamentos.

  1. Se o recorrente usa exactamente a mesma argumentação, com reprodução “pari passu” das conclusões da alegação produzida na apelação, fica plenamente justificado o uso da faculdade remissiva do n.º 5 do artigo 713.º do Código de Processo Civil ou, e no limite, uma fundamentação muito sucinta.

  2. A fundamentação das respostas aos quesitos – quer quanto aos provados, quer quanto aos não provados – basta-se com uma explicação sucinta do “iter” lógico-dedutivo que levou à conclusão encontrada.

  3. Mas esse processo, insondável e íntimo, não tem de ser transposto para a motivação, que se limita a elencar criticamente as provas consideradas credíveis.

  4. Contra a falta ou a insuficiência da motivação reage-se, na 1ª Instancia, com o incidente do n.º 4 do artigo 653.º do Código de Processo Civil, sendo de aplicar, na Relação, o nº 5 do artigo 712ª.

  5. Há união (ou coligação) de contratos quando surgem conectados dois acordos negociais e o segundo depende da outorga do primeiro por existir um vínculo externo gerador dessa junção, sendo que a vontade das partes quis esse nexo funcional.

  6. Não é admissível a execução específica – nos termos do artigo 830.º do Código Civil – de promessa de doação, já que a vontade solutória tem de ser actual, devendo manter-se até à formalização do negócio, pois que a natureza pessoal da doação justifica que as partes conservem a possibilidade de desistir do contrato definitivo até à sua outorga, embora podendo incorrer em responsabilidade pelo incumprimento.

  7. Ademais, a jurisprudência e a doutrina dividem-se quanto à possibilidade/admissibilidade da promessa de doação.

  8. No mandato sem representação o mandatário age em nome próprio e no interesse, ou por conta, do mandante mas não surge como seu representante.

  9. Por isso adquire, por ingressarem na sua esfera jurídica, os direitos e obrigações que decorrem dos actos que celebra, ficando, todavia, obrigado a, no termo do negócio, transferir para o mandante a titularidade dos direitos adquiridos em execução do mandato.

  10. No mandato sem representação não há “specific performance”, por o regime do artigo 830.º do Código Civil se limitar ao contrato-promessa.

  11. O incumprimento do disposto no n.º 1 do artigo 1181.º do Código Civil origina, ou pedido de indemnização pelos danos causados ou pedido de condenação do mandatário na transferência para o mandante dos direitos que adquiriu em execução do mandato.

  12. Mas os danos resultantes de outros actos lesivos do bem transferendo têm de ser ressarcidos em acção para tal instaurada.

  13. Embora como segmento de revista, não é admissível recurso para o Supremo Tribunal de Justiça a parte decisória que, se apreciada autonomamente, integraria um agravo em 2.ª Instância, sem que se perfilem as excepções dos n.ºs 2, “in fine” e n.º 3 do artigo 754.º do Código de Processo Civil, como acontece no recurso do despacho da 1.ª Instância, confirmado pela Relação, que condena a parte como litigante de má fé.

    Decisão Texto Integral: Acordam, no Supremo Tribunal de Justiça No Circulo Judicial de Vila Nova de Famalicão, AA e sua mulher BB intentaram acção, com processo ordinário, contra CC e DD.

    Pediram a sua condenação nos seguintes termos: - Réu CC a reconhecer que a casa de habitação que faz parte do prédio que descreve e a faixa de quintal, desde o sul e junto à casa até ao limite fixado por uma linha recta alinhada pelas empanadas do coberto a norte, lhes pertence exclusivamente; - A ver proferida sentença, de acordo com o disposto no artigo 830.º do Código Civil a declarar que aquele prédio pertence exclusivamente aos Autores por doação do primeiro Réu, de modo a poderem registar a transmissão a seu favor; - Ordenado o cancelamento de quaisquer inscrições e registos desse prédio a favor do 1.º Réu ou de terceiros; - Reparar o telhado da habitação; abrir uma entrada a sul do prédio; cimentar o terreiro do lado poente da casa; colocar um motor para extracção de água do poço; autorizar os Autores ou os seus electricistas a deslocarem-se ao poço para repararem quaisquer avarias; construir um anexo para arrumação a norte da casa; - Pagar todas as despesas, designadamente o registo com a transmissão do prédio; - A absterem-se, os dois Réus, de praticarem actos lesivos do direito dos Autores e a indemnizarem-nos pelos danos sofridos.

    No essencial, alegaram a celebração de um contrato inominado e de uma escritura de compra e venda com o preço simulado, acordos que os Réus incumpriram.

    Contestaram ambos, sendo que o 1.º Réu deduziu reconvenção para que fosse declarada a anulação do contrato promessa e os Autores considerados inquilinos, com a renda mensal de 1.000,00 euros, mas o 2.º Réu ser considerado parte ilegítima.

    A 1.ª Instância julgou a acção improcedente – logo no despacho saneador – e procedente a reconvenção.

    Proferida sentença, veio a Relação, em sede de recurso, ordenar que fosse realizado novo julgamento, apenas quanto à parte da matéria de facto (quesito 2°), aditados novos quesitos, e, em consequência, proferida nova sentença.

    Em obediência ao ordenado, aditaram-se 13 artigos à base instrutória.

    Realizada nova audiência de discussão e julgamento, a 1.ª Instância veio a decidir nos seguintes termos:

    1. Condenar o réu CC a reconhecer aos autores AA e BB o direito à execução específica do contrato celebrado, e, em consequência, declara-se transmitido para estes o direito de propriedade sobre o prédio urbano — a casa de habitação que faz parte do prédio descrito no artigo 1° — da petição inicial e a faixa de quintal desde o sul junto à casa de habitação até ao limite fixado por uma linha recta alinhada pelas empanadas do coberto, a norte (descrito na C.R.P. de V. N. Famalicão, sob o n° 00403/061295-Antas, conforme resulta dos documentos comprovativos do registo da presente acção).

    2. Condenar o réu CC: 1) A reparar o telhado da casa de habitação dos autores, substituindo todas as telhas que estiveram partidas e tapar os buracos; 2) A abrir uma entrada a Sul do prédio (no redondo), na confrontação com o caminho público; 3) A reparar o chão (terreiro do lado Poente da casa), cimentando-o, de modo a evitar os constantes lamaçais; 4) A colocar um motor para extracção da água do poço, bem como ligar a água para a casa dos autores; 5) A autorizar os autores, ou qualquer electricista que estes contratem, a deslocar-se ao poço sempre que se torne necessário para reparar qualquer avaria; 6) A construir um anexo para arrumos, a norte da cada de habitação dos autores, no terreno sobrante da parcela de terreno destacada, ou seja, da faixa de terreno situada a norte da habitação, entre esta e as empanadas do coberto que existia; 7) A pagar todas as despesas com a transmissão do prédio para os autores, designadamente os actos de registo.

    3. Condenar os réus CC e DD: 8) A absterem-se de praticar quaisquer actos que lesem os direitos dos autores, e a retirarem da faixa de quintal mais a norte tudo o que nele construíram abusivamente, no terreno que pertence aos autores, conforme o acordado; 9) A indemnizarem os autores pelos prejuízos que lhe estão a causar por os terem privado de água e de agricultar o quintal na faixa que ocupam, e cuja liquidação se relega para execução de sentença, por, nesta fase, não ser previsível a data em que vai terminar a situação lesiva que os réus criaram aos autores, com a destruição dessa parte do quintal.

    4. No mais, julgar-se improcedente a acção.

    5. Julgar ainda totalmente improcedente o pedido reconvencional deduzido pelo réu CC, dele absolvendo os aqui autores/reconvindos.

    6. Condenar os réus no pagamento da totalidade das custas do processo.

    7. Condenar os réus CC e DD como litigantes de má fé em multa de 15 Ucs cada um.

    8. E ainda numa indemnização, a fixar aos autores, para o que se ordena a notificação das partes nos termos e para os efeitos do previsto no art. 457.º n° 2 do CPC.

    A fls. 909 ss, em complemento da sentença proferida nos autos, foram os RR condenados, como litigantes de má fé, no pagamento dos honorários devidos ao Mandatário dos AA, que se fixaram em 4500,00; nada se fixou, nesse âmbito, a título de despesas com alimentação e deslocações, alegadamente suportadas pelos AA; indeferiu-se a reforma da sentença, requerida pelos AA, no sentido de ser ordenado o cancelamento de todas as inscrições a favor do Réu ou de terceiros.

    Inconformados, Autores e Réus apelaram para a Relação do Porto que negou provimento ao recurso destes e deu parcial provimento à apelação dos Autores ordenando “o cancelamento da inscrição registral da aquisição do prédio, feita pela apresentação de 6 de Dezembro de 1995, a favor do 1.º Réu, e do qual depende o registo de aquisição pelos Autores.” Estes pediram a reforma do Acórdão quanto a custas, incidente que foi indeferido.

    Os Réus pedem agora revista formulando as seguintes conclusões: A – O doc. n.º 2 junto com a p.i configura um “contrato-promessa de doação”, em termos de grande clareza formal; B - por um lado, o 1.º Réu, que tinha acabado de adquirir o prédio identificado em A) ao Dr. EE, advogado na Comarca de V. N. Famalicão, C - comprometeu-se a doar aos Autores a “parte restante do prédio (referido) depois de feito o destaque, ou seja a casa em si”; D - sendo que esta casa estava a ser habitada por eles, Autores, na qualidade de inquilinos; E - ao mesmo tempo, o 1° Réu ainda se comprometeu a proceder a um conjunto de benfeitorias e obras na mesma casa (parte final do mesmo documento); F - por sua vez, os Autores comprometeram-se “a deixar livre e de cultivar todo o terreno do quintal, bem como o coberto nele implantado”.

    G - Estes dois conjuntos de expressões configuram, sem necessidade de recurso a outros meios de interpretação, de um modo claro...

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