Acórdão nº 607/07.STJLSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 23 de Junho de 2010

Magistrado ResponsávelVASQUES DINIS
Data da Resolução23 de Junho de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA PARCIALMENTE A REVISTA Sumário : - A Constituição da República Portuguesa, no seu artigo 56.º, consagra o direito de contratação colectiva, conferindo ao legislador ordinário uma ampla margem de actuação no estabelecimento das normas por que devem reger-se as relações colectivas de trabalho, maxime, no tocante à fixação de limites atinentes ao objecto da contratação colectiva, sem que se possa afirmar que a fixação de tais limites ofendem o princípio da autonomia da contratação colectiva, subjacente ao referido direito/garantia.

II - Uma interpretação das normas infraconstitucionais que propenda a conferir prevalência ao legislado, designadamente por aplicação do princípio do tratamento mais favorável, em detrimento do convencionado, não pode ter-se como violadora do princípio da autonomia da contratação, subjacente às referidas normas constitucionais.

II - O princípio do tratamento mais favorável, consignado no artigo 13.º, n.º 1 da LCT (Regime Jurídico do Contrato Individual de Trabalho, aprovado pelo Decreto-Lei n.º 49 408, de 24 de Novembro de 1969) e com expressão na alínea c) do artigo 6.º da LRCT (Regime Jurídico das Relações Colectivas de Trabalho, constante do Decreto-Lei n.º 519-C1/79, de 29 de Dezembro), impõe a aplicação do regime mais benéfico sempre que normas de grau hierárquico diferente concorram entre si na solução do caso concreto, salvo quando a norma hierarquicamente superior se oponha à sua modificação por norma de grau hierárquico inferior; é que o mencionado preceito encara o dito princípio numa perspectiva concreta e parcial (teoria do cúmulo), e não numa perspectiva global (teoria da conglobação).

III - A retribuição é constituída pelo conjunto de valores (pecuniários e em espécie) que a entidade empregadora está obrigada a pagar regular e periodicamente ao trabalhador em razão da força de trabalho por ele oferecida, aqui avultando o elemento da contrapartida, elemento esse de grande relevo na medida em que evidencia o carácter sinalagmático do contrato de trabalho, permitindo, assim, excluir do âmbito do conceito de retribuição as prestações patrimoniais do empregador que não decorram do trabalho prestado, mas que, ao invés, prossigam objectivos com justificação distinta.

IV - Enformando o conceito de retribuição, surgem, também, as características da periodicidade e da regularidade que, por um lado, apoiam a presunção da existência de uma vinculação prévia, e, por outro, assinalam a medida das expectativas de ganho do trabalhador, conferindo assim relevância ao nexo existente entre a retribuição e as suas necessidades pessoais e familiares.

V - A regularidade da retribuição está associada à sua constância; a periodicidade significa que a retribuição é satisfeita em períodos certos ou aproximadamente certos no tempo.

VI - A retribuição, constituída por um conjunto de valores, é, num primeiro momento, determinada pelo clausulado do contrato, por critérios normativos (como sejam o salário mínimo e o princípio da igualdade salarial) e pelos usos da profissão e da empresa; num segundo momento, a retribuição global compreende não só a remuneração base, como também prestações acessórias, que preencham os enunciados requisitos da regularidade e da periodicidade.

VII - Estatuindo os artigos 82.º, n.º 3, da LCT e 249.º, n.º 3 do Código do Trabalho de 2003 que qualquer atribuição patrimonial efectuada pelo empregador em benefício do trabalhador constitui, salvo prova em contrário, parcela da retribuição, ao trabalhador apenas incumbe alegar e provar a satisfação, pelo empregador, de determinada atribuição patrimonial, seus quantitativos e respectiva cadência, cabendo depois, ao empregador, a demonstração de que a mesma se não caracteriza por todos ou por alguns dos elementos supra referidos em III e IV para afastar a sua natureza retributiva.

VIII - Nas férias, e no respectivo subsídio, deverão incluir-se todas as prestações pecuniárias que, tendo natureza retributiva, o trabalhador haja auferido, o que também estava estabelecido nos Acordos de Empresa TAP/SITEMA até 1994.

IX - No AE TAP/SITEMA de 1994, surpreende-se a inclusão no elenco das importâncias que não se consideram retribuição das auferidas a título de subsidio de disponibilidade, referência que veio a manter-se no correspondente clausulado do AE TAP/SITEMA de 1997.

X - O valor do subsídio de Natal, até ao Decreto-Lei n.º 88/96, de 3 de Julho (que instituiu a obrigatoriedade do seu pagamento) apenas encontra a sua fonte na contratação colectiva, no caso, no AE TAP/SITEMA de 1985, sendo que, com a entrada em vigor daquele diploma, o valor do subsídio de Natal era de igual montante a um mês de retribuição, nos termos determinados no artigo 82.º da LCT.

XI - Com a entrada em vigor do Código do Trabalho, em 1 de Dezembro de 2003, o cálculo do subsídio de Natal reconduz-se ao somatório da retribuição base e das diuturnidades, delas se excluindo os complementos salariais, ainda que auferidos regular e periodicamente já que o “mês de retribuição”, a que se refere o n.º 1 do artigo 254.º, terá de ser entendido de acordo com a regra supletiva constante do n.º 1 do art. 250.º, nos termos do qual a respectiva base de cálculo se circunscreve à retribuição base e diuturnidades.

XII - Tanto no regime legal, como no regime convencionalmente estabelecidos nos vários AE TAP/SITEMA, o trabalho extraordinário ou suplementar sempre teve remuneração mais elevada do que o prestado no período normal de trabalho, ou seja, com acréscimos calculados em função da retribuição normal ou retribuição base.

XIII - O valor da retribuição normal, integrante da remuneração do trabalho extraordinário, não pode deixar de considerar-se «contrapartida do trabalho», enquanto prestação que corresponde à remuneração da actividade, objecto do contrato, executada pelo trabalhador.

XIV - Os referidos acréscimos têm como causa especifica, não, directamente, a prestação da actividade em si, mas a circunstância de ela ser prestada fora do período normal, e pressupõem um esforço acrescido, correspondendo, pois, à contrapartida pecuniária da penosidade representada pelo acréscimo de esforço físico e psíquico, pela redução do tempo normal de descanso e pela perturbação dos ritmos a que, naturalmente, devem obedecer os períodos da actividade laboral e sua suspensão.

XV - Estando em causa determinar o valor de atribuições patrimoniais devidas anualmente correspondentes a um mês de retribuição, o critério seguro para sustentar a expectativa do trabalhador, baseada na regularidade e periodicidade, há-de ter por referência a cadência mensal, independentemente da variação dos valores recebidos e, assim, considerar-se regular e...

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