Acórdão nº 2280/07.1TVLSB.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 29 de Abril de 2010

Magistrado ResponsávelSALAZAR CASANOVA
Data da Resolução29 de Abril de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: CONCEDIDA A REVISTA Sumário : I - A estipulação num contrato-promessa de compra e venda de que a escritura poderá ser realizada num determinado período após conclusão da obra em data que está mencionada nesse contrato, conjugada com outras estipulações que apenas admitem a realização da escritura em diversa data se a obra for concluída em momento anterior ou não for possível outorgar escritura de compra e venda por falta de licenciamento, tal estipulação adquire o significado, à luz da doutrina da impressão do destinatário (arts. 236.º e segs. do CC), de termo essencial relativo que se traduz em cláusula resolutiva.

II - Por isso, incorrendo o promitente vendedor em mora por não concluir a obra no assinalado prazo, admitindo a possibilidade de a conclusão se verificar em momento ulterior, que indica, produz efeitos resolutivos a interpelação efectuada pelo promitente comprador nos termos do art. 808.º do CC, fixando ao promitente vendedor prazo para conclusão da obra (coincidente, aliás, com aquele que o promitente vendedor em mora estimou como sendo o da conclusão) sob pena de resolução do contrato.

III - A circunstância de o promitente vendedor ter sido intimado a “entregar o imóvel” em vez de intimado a “concluir o imóvel” não lhe retira eficácia visto que, no contexto do contrato e das relações entre as partes, não se suscita dúvida alguma de que o promitente comprador pretendia a conclusão da obra, pois só a partir desse momento é que, em conformidade com o estipulado, poderia cumprir a obrigação, que sobre si impendia, de designar data para outorga da escritura de compra e venda.

Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1. AA demandou em acção declarativa com processo ordinário E.P.U.L. - Empresa Pública de Urbanização de Lisboa pedindo o seguinte: - Que se declare resolvido o contrato-promessa de compra e venda celebrado entre A. e ré.

- Que se condene a ré a restituir ao A. a quantia recebida a título de sinal, em dobro, no valor de 53.998,00€.

- Que se condene a ré no pagamento de 4.808,48€, correspondente aos encargos fiscais que o A. teve que suportar pelo não reinvestimento de mais-valias.

- Que a tal quantia acresçam juros desde a citação da ré até integral pagamento, bem como os juros devidos, desde a condenação da ré até efectivo e integral pagamento da dívida, nos termos do artigo 829.º-A do Código Civil.

  1. Por decisão de 10-3-2008 da 1ª Vara Cível (2ª secção) da comarca de Lisboa a acção foi julgada parcialmente procedente, condenando-se a ré a pagar ao A. a quantia de 53.998,00€ (cinquenta e três mil novecentos e noventa e oito euros) acrescida de juros de mora, à taxa legal, a contar da citação e até integral pagamento, bem como a sanção pecuniária compulsória prevista no artigo 829.º/4 do Código Civil, desde a data em que a sentença transitar em julgado até efectivo pagamento, absolvendo-se a ré do demais peticionado.

  2. O Tribunal da Relação, interposto recurso pela ré da decisão de 1ª instância, concedeu provimento à apelação e, revogando a sentença, absolveu a ré do pedido.

  3. Recorre agora o A. para o Supremo Tribunal de Justiça finalizando a sua minuta de recurso com as seguintes conclusões: I- Constitui causa do incumprimento definitivo de um contrato-promessa de compra e venda a não realização da prestação devida ao credor durante o prazo admonitório por este estabelecido - artigo 808.º do Código Civil.

    II- Encontrando-se estabelecido no contrato-promessa que o contrato definitivo será celebrado entre 15 de Julho de 2006 e 15 de Outubro de 2006, a recorrida (promitente vendedora) incumpre a sua obrigação quando comunica que não irá celebrar o contrato prometido dentro do prazo fixado.

    III- Perante a cláusula contratual que permite a celebração de um aditamento ao contrato-promessa para prorrogação do prazo neste estabelecido em virtude do atraso na emissão de licença de utilização, não estará o promitente comprador obrigado a celebrar esse aditamento quando esse atraso seja devido a demora na conclusão da obra por motivo exclusivamente imputável à promitente vendedora, encontrando-se esta em incumprimento contratual.

    IV- Constitui interpelação completa e eficaz, feita pelo promitente comprador ao promitente alienante, aquela que determina que o contrato-promessa considerar-se-á resolvido, caso a promitente vendedora não entregue, até ao dia 31 de Dezembro de 2006, o imóvel prometido vender.

    V- Se, findo esse prazo, o promitente vendedor não der cumprimento à interpelação admonitória, essa parte deve ser considerada como causadora de incumprimento definitivo do contrato-promessa.

    VI- Constitui fixação de prazo razoável para cumprimento do contrato-promessa de compra e venda, a estipulação, por parte do promitente comprador, de uma data compreendida dentro do lapso temporal indicado pela própria promitente vendedora para a celebração da escritura do contrato de compra e venda.

    VII- Deverá ser declarado resolvido, ao abrigo do disposto no artigo 808.º,nº1 do Código Civil, o contrato-promessa, não cumprido pela promitente vendedora que se encontra em mora, no prazo estipulado por interpelação feita pelo promitente comprador, devendo aquela ser condenada na devolução em dobro, das quantias recebidas a título de sinal, acrescida de juros de mora e da sanção pecuniária compulsória, peticionada pelo autor.

    VIII- Ao julgar de forma contrária, o douto acórdão recorrido julgou em desconformidade com o disposto, entre outros, nos artigos 808.º/1, 442.º/2 , 805.º e 829.º-A todos do Código Civil 5. Factos provados: 1. O Autor e a Ré celebraram, em 28 de Dezembro de 2005, um contrato, a que deram a designação de “contrato-promessa de compra e venda”, nos termos constantes do doc. nº 1 junto com a p.i. (al.A).

  4. Através de tal contrato, a ré prometeu vender e o Autor prometeu comprar a fracção que seria correspondente à letra “D”, pisos 2 e 3 do prédio urbano sito na Rua …, n.º …, em Lisboa, descrito na 7ª Conservatória do Registo Predial de Lisboa, sob a ficha .., da freguesia de Santa Isabel, inscrito na matriz predial urbana sob o artigo 4 da referida freguesia de Santa Isabel (al. B).

  5. Foi estipulado, para tal contrato, o preço de total de 269.990,00€ (duzentos e sessenta e nove mil novecentos e noventa euros) (al. C).

  6. Foi convencionado que o pagamento do preço seria efectuado nos moldes constantes da cláusula segunda do contrato-promessa (al. D).

  7. De harmonia com o estipulado nessa cláusula, a quantia de 26.999,00€ (vinte e seis mil novecentos e noventa e nove euros) seria paga no acto de celebração do contrato-promessa (al. E).

  8. O pagamento da quantia referida em 5. foi efectuado pelo autor à ré através do cheque n.º …, sacado sobre o Banco Espírito Santo, no valor de 24.499,00€ (vinte e quatro mil quatrocentos e noventa e nove euros), bem como de um outro cheque, no valor de 2.500,00€ (dois mil e quinhentos euros) (al. F).

  9. A ré entregou ao autor os recibos de quitação referentes às quantias tituladas pelos cheques mencionados em 6. (al. G).

  10. A segunda parte do preço, que perfazia a quantia de 33.748,75€ (trinta e três mil setecentos e quarenta e oito euros e setenta e cinco cêntimos), correspondente a 12,5% do preço total, seria paga em 15.04.2006 (al. H).

  11. A quantia remanescente de 209.242,25€ (duzentos e nove mil duzentos e quarenta e dois euros e vinte e cinco cêntimos), correspondente a 77,5% do preço, seria paga no acto de celebração da escritura pública de compra e venda (al. I).

  12. Ficou ainda estipulado no contrato-promessa que a outorga da escritura pública poderia “ser realizada a partir de 15 de Julho de 2006 e até 15 de Outubro de 2006” (cláusula sexta, nº 1, do contrato-promessa), ficando a marcação da mesma a cargo do autor (cf. cláusula sexta, nº 2, do contrato-promessa) (al. J).

  13. À ré cabia a possibilidade de alterar a data da escritura, prevendo-se, para tal, a possibilidade de...

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