Acórdão nº 0876/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 28 de Abril de 2010
Magistrado Responsável | CASIMIRO GONÇALVES |
Data da Resolução | 28 de Abril de 2010 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: RELATÓRIO 1.1. Da sentença proferida pelo TAF de Mirandela na impugnação contra a liquidação de IVA dos anos de 1991 e 1992 efectuada à sociedade “C…Lda.”, e que a julgou parcialmente procedente, recorrem quer os impugnantes A… e B… (que deduziram a impugnação na sequência de notificação de despacho de reversão contra eles proferido no processo executivo instaurado contra aquela sociedade originariamente ali executada) quer a Fazenda Pública.
1.2.1. No recurso interposto pela Fazenda Pública, esta termina as respectivas alegações formulando as Conclusões seguintes: 1ª - O procedimento de revisão da matéria colectável previsto no art. 91° da LGT, ocupa, na ordenação sistemática do procedimento de liquidação, o espaço que medeia entre a conclusão dos actos de Inspecção e a fixação definitiva da matéria colectável; 2ª - O prazo de 30 dias para requerer a abertura do procedimento, conta-se da data da notificação da fixação da matéria colectável e tem efeito suspensivo da liquidação do tributo.
3ª - Basta atentar na atribuição do efeito suspensivo da liquidação, para alcançar a conclusão de que o procedimento de revisão é sempre anterior à liquidação que suspende; 4ª - Esta conclusão, que decorre da natureza e da inserção sistemática do procedimento de revisão, no procedimento mais vasto de liquidação, sai reforçada pela formulação legal do prazo do exercício do direito; 5ª - Ao contrário do que acontece relativamente à reclamação graciosa e à impugnação judicial, o legislador não previu o momento adequado para o responsável subsidiário abrir o procedimento de revisão, fixando a data a partir da qual o requerimento haveria de ser apresentado; 6ª - E não o fez, acertadamente, em coerência com a solução que adoptou para os casos de reacção do responsável subsidiário contra a legalidade da liquidação subjacente à divida que lhe é exigida na execução fiscal; 7ª - O nº 4 do art. 22° da LGT ao consagrar o direito de reclamação ou impugnação da dívida, tem em vista as formas típicas de reacção contra a ilegalidade dos actos de liquidação, ou seja a reclamação graciosa e a impugnação judicial; 8ª - Nem sequer se entenderia uma solução legal que pudesse conduzir, na maior parte dos casos, à impossibilidade de nova liquidação por via da caducidade, quando se sabe que a reversão, em regra, acontece muito para além dos quatro anos contados do facto tributário ou do ano seguinte ao do facto; 9ª - O disposto no nº 5 do art. 86° da LGT e no nº 1 do art. 117° do CPPT, não obstam que se admita a impugnação judicial deduzida pelo responsável subsidiário, nos termos do nº 4 do art. 22° da LGT, mesmo na falta de intervenção da comissão de revisão; 10ª - Se o procedimento de revisão só pode ser requerido no prazo de 30 dias contados da notificação da fixação da matéria colectável por métodos indirectos e nessa data é o responsável originário que é parte no procedimento, não pode exigir-se ao responsável subsidiário o cumprimento de condição de impugnabilidade que à data, não estava na sua disponibilidade; 11ª - O despacho que indeferiu a abertura do procedimento de revisão, por extemporaneidade, não enferma de qualquer ilegalidade, nem restringe os direitos impugnatórios dos responsáveis subsidiários; 12ª - O processo de impugnação judicial, em que vigora como princípio estruturante, o princípio do inquisitório, permite a tutela judicial efectiva dos direitos dos impugnantes, uma vez que o Juiz não só pode, como deve, aceitar a produção de prova requerida pelas partes, nomeadamente a pericial e ordenar todas as diligências que considere úteis ao apuramento da verdade; 13ª - Nos casos de responsabilidade subsidiária como é o dos presentes autos, a existência de pedido de revisão da matéria colectável não é condição de procedibilidade da impugnação judicial.
14ª - Porém, se esse não for o entendimento desse Venerando Tribunal e se considerar que a recusa de abertura do procedimento de revisão interposto pelos aqui impugnantes configura vício de forma por preterição de formalidade essencial; 15ª - Tal vício não poderá ter como consequência a anulação a liquidação nos termos da decisão sob recurso; 16ª - Ao contrário do decidido, um vício de forma por preterição de formalidade, ocorrido seis anos após o acto de liquidação impugnado, não pode projectar efeitos invalidantes sobre um acto tributário que o antecede; 17ª - A ilegalidade do acto tributário de liquidação, a existir, só poderá ser encontrada no procedimento que originou esse acto tributário e não, como resulta da sentença recorrida, em acto administrativo muito posterior e completamente distinto e exterior ao acto de liquidação; 18ª - A recusa em admitir o pedido de revisão, se ilegal, poderia e deveria ter sido objecto de recurso contencioso, nos termos da alínea p) do nº 1 do art. 97° do CPPT, por se tratar de questão tributária que não comporta apreciação da legalidade do acto de liquidação; 19ª - A sentença, na parte em que julgou procedente a impugnação com base em vício de forma por preterição de formalidade essencial, enferma de erro de julgamento, desde logo porque não se verificou a preterição de qualquer formalidade e, mesmo que assim não se entenda, a ter-se verificado, tal vício não pode ter consequências na legalidade da liquidação do IVA.
Termina pedindo que o recurso seja julgado procedente, com as legais consequências.
1.2.2. Contra-alegando, os recorridos formulam as seguintes Conclusões: 01 - Alega a Recorrente que o Tribunal a quo incorreu em erro de direito ao anular as liquidações referidas na Sentença por preterição de formalidades essenciais, assacando-lhe a errada aplicação do nº 4 do artigo 22°, do nº 5 do artigo 86º e do artigo 91° todos da Lei Geral Tributária, bem como do nº 1 do artigo 117° do Código de Processo e Procedimento Tributário.
02 - O thema decidendum do presente Recurso subsume-se a saber se os responsáveis subsidiários podem/devem na sequência da reversão da execução pedir a Revisão da matéria tributável (artigo 91° da Lei Geral Tributária) quando o imposto exequendo resulta da fixação da matéria colectável por métodos indirectos e pretendam discutir a sua quantificação ou a aplicação de tais métodos.
03 - A Recorrente pretende defender a legalidade da rejeição do procedimento de revisão oportunamente deduzido com o fundamento na “extemporaneidade” da sua apresentação, argumento que redunda no efeito prático de, liminarmente, obstar a possibilidade de o contribuinte revertido reagir graciosamente a um acto do qual não foi parte e de que, de resto, não teve in casu, conhecimento.
04 - Ainda que mascarada sob a capa da “extemporaneidade” o cerne da questão decidenda reside em saber se os responsáveis subsidiários têm ou não legitimidade para deduzir o procedimento de revisão, quando é certo é que decorre do nº 4 do artigo 22° da LGT que as faculdades de impugnação graciosa e judicial do acto tributário são as mesmas e têm de ser utilizadas nos mesmos termos que devedor principal.
05 - De acordo com a doutrina e com a jurisprudência o acesso à justiça do responsável subsidiário garante-lhe o direito de reclamação da matéria tributável nos mesmos termos do devedor principal, ou seja, não pode recusar-se ao responsável subsidiário as mesmas possibilidades de reclamação e de impugnação judicial que são atribuídas ao devedor originário, pelo que os Alegantes tinham direito a apresentar pedido de revisão da matéria tributável no prazo de 30 dias a contar da data em que for efectuada a citação, acto que equivale à notificação para efeitos do nº 1 do art. 91º da LGT.
06 - Os ora Recorridos apresentaram em tempo o Procedimento de Revisão, conquanto reagiram à determinação da matéria tributável fixada por métodos indirectos no prazo legalmente previsto, assim que dela tiveram conhecimento, i.e., dentro dos 30 dias subsequentes à citação da reversão.
07 - A Fazenda Pública interpreta de forma inconstitucional a articulação dos institutos da responsabilidade tributária e dos meios de reacção à avaliação indirecta, nomeadamente o nº 4 do artigo 22º, o nº 5 do art. 86° e o artigo 91º da LGT, bem como o nº 1 do artigo 117º do CPPT, 08 - quando é certo que o nº 3 do artigo 9º do Código Civil prescreve que “Na fixação do sentido e alcance da Lei o interprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas(…)” 09 - O Procedimento de Revisão deveria ter sido admitido e decidido, pelo que bem andou a Sentença a quo ao julgar que a sua rejeição constitui uma clara preterição de formalidade essencial, e, nos termos do artigo 99° d) do CPPT a determinar a anulação dos actos tributários.
10 - O pedido de revisão da matéria colectável previsto no art. 91º da LGT é um meio gracioso de impugnar a decisão administrativa de fixação da matéria colectável, cuja utilização é obrigatória quando a matéria colectável foi fixada através de métodos indirectos, nos termos dos arts. 87º a 90º daquela lei.
11 - Nessa conformidade, quando, como no caso dos autos, o acto de que se reage resulta da fixação da matéria colectável por métodos indirectos, o contribuinte tem de apresentar previamente o pedido de revisão da matéria colectável, e a Administração Fiscal, nada obstando nos termos do artigo 92º, tem de aceitar o mesmo e despoletar os seus ulteriores termos.
12 - Quanto à questão do efeito suspensivo da liquidação brandido pela Fazenda Pública como óbice sistemática à dedução do pedido de revisão pelos responsáveis subsidiários, comanda a lógica que a eficácia da liquidação em relação ao responsável subsidiário, designadamente para efeitos de impugnação, ficará dependente de um ulterior acto de notificação que comunique àquele a manutenção da liquidação anterior ou a efectivação de uma nova liquidação e o prazo para impugnar, como impõe, o nº 6 do art. 77° da LGT e os nºs. 1 e 2 do art. 36º do CPPT.
13 - Para além de ser condição de impugnação judicial do acto...
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