Acórdão nº 3501/06.3TVLSB.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 08 de Abril de 2010

Magistrado ResponsávelLOPES DO REGO
Data da Resolução08 de Abril de 2010
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

S Privacidade: 1 Meio Processual: REVISTA Decisão: NEGADA A REVISTA Sumário : 1.Os deveres de comunicação e de informação, estabelecidos nos arts. 5º e 6º, nº1, do DL 446/85, - cujo âmbito se determina em concreto, perante o nível cultural revelado pelo aderente e a complexidade do negócio e extensão do clausulado - implicam que a entidade que pretenda inserir cláusulas contratuais gerais nos contratos singulares que celebra deva comunicá-las antes da conclusão do negócio, de modo a proporcionar à contraparte a indispensável reflexão e um conhecimento completo e efectivo do clausulado, cumprindo-lhe ainda informar e esclarecer espontaneamente o aderente da estrutura prático-jurídica do negócio e da sua possível vinculação a gravosos efeitos ou consequências, sem prejuízo da diligência comum àquele exigível .

  1. O incumprimento de tais deveres implica que as cláusulas não devidamente comunicadas e informadas se devam considerar excluídas dos contratos singulares celebrados com os aderentes.

  2. Sendo de considerar excluídas as cláusulas, inseridas em contrato de ALD com promessa bilateral de compra e venda do veículo no termo da respectiva locação, que facultam ao locador a resolução imediata do contrato, com base em simples mora, e estabelecem em seu benefício o direito a obter do locatário indemnizações manifestamente desproporcionadas, a resolução da relação contratual complexa convencionada só pode fazer-se nos termos gerais previstos no art. 808º do CC, pressupondo a efectivação de prévia interpelação admonitória ao devedor.

  3. A indemnização a que alude o nº2 do art. 1045º do CC é inaplicável à hipótese de falta de pontual restituição do veículo no termo do contrato de ALD a que vai acoplada a promessa da respectiva venda ao locatário, no termo da relação contratual.

    Decisão Texto Integral: Acordam no Supremo Tribunal de Justiça: 1.AA – Aluguer de Automóveis, S.A. instaurou acção condenatória, na forma ordinária, contra BB, Lda e CC, com fundamento no incumprimento de três das prestações mensais fixas, convencionadas no âmbito de um contrato de aluguer de veículo sem condutor, pelo período de 60 meses, em que figurava como locatária a sociedade R. e como fiador o 2º R, o que teria legitimado a resolução imediata e automática do contrato, originando os consequentes deveres de restituição do veículo e ressarcimento de múltiplos danos alegadamente sofridos pela A., contabilizados em €3.433,86 e respectivos juros, bem como o pagamento de sanção pecuniária compulsória até à efectiva restituição da viatura em causa.

    O R. CC contestou, impugnando parcialmente a versão fáctica da A., alegando, desde logo, que as cláusulas inseridas no contrato de adesão celebrado não lhe teriam sido explicadas, ao intervir como gerente da 1ª R. na celebração do contrato , supondo, em consequência, que a substância do negócio realizado envolveria, não um aluguer de longa duração, mas antes uma venda a prestações, invocando ainda invalidade da fiança e questionando os valores indemnizatórios peticionados, reveladores da litigância de má-fé por parte da A.

    Seguiram-se os demais articulados admissíveis, em que os litigantes reiteraram as suas posições, alegando a A., na réplica, a existência de um contrato promessa de compra e venda da viatura, a consumar após conclusão e cumprimento da dita locação.

    Depois de ter sido definitivamente dirimida a questão da competência territorial para a causa, procedeu-se a saneamento e condensação; e, após julgamento, foi proferida sentença a julgar a acção parcialmente procedente, condenando os RR a pagar à A. a quantia de €1.144,62 – relativa aos 3 últimos alugueres não liquidados, e respectivos juros Inconformadas, recorreram . para a Relação ambas as partes, pugnando a A. pelo reconhecimento do direito aos montantes pecuniários por si peticionados e o 2º R., sustentando que os montantes em dívida deveriam ser retirados do valor da caução prestada, que a A. mantém em seu poder. Porém, ambas as apelações foram julgadas improcedentes, sendo proferido acórdão a confirmar a sentença recorrida.

  4. É deste acórdão que vem interposta revista pela sociedade A. que encerra a sua alegação com as seguintes conclusões, que delimitam o objecto do recurso: 1. Não assiste qualquer razão em excluir-se_as Condições Gerais do contrato dos autos uma vez que o A. na acção, ora recorrente, cumpriu o dever de comunicação a que alude o artigo 5o do Decreto-Lei n.° 446/85, de 25 de Outubro, em relação às ditas Condições Gerais.

  5. Como resultou provado nos presentes autos, nas alíneas b), c), d), e), f), g), p) e x) dos factos provados, o certo é que, o A., ora recorrente, efectivamente cumpriu o dever de comunicação a que estava obrigado uma vez que como resultou provado, o A. na acção, ora recorrente, adquiriu o veiculo dos autos, entregando-o à R concedendo-lhe o gozo do mesmo em conformidade com as condições em que tinha sido previamente ajustado o negócio entre o representante da R. na acção, ora recorrida, e o fornecedor do veículo, assegurando, assim, que tais condições contratuais previamente acordadas constassem - como efectivamente sucedeu - do contrato dos autos.

  6. Não se devia, assim, ter concluído pela exclusão das Cláusulas das Condições Gerais do Contrato por pretenso não cumprimento pela A. do dito dever de comunicação relativamente à R., ora recorrida, sendo que o representante desta, R. ora recorrida, jamais solicitou ao A ou a quem quer que fosse qualquer esclarecimento quanto às mesmas.

  7. Aliás, ressalta do contrato dos autos que aquando da assinatura pelo representante da R., ora recorrida, do contrato de aluguer de longa duração dos autos já as respectivas condições gerais deste, bem como tudo o que nele é impresso, se encontravam integralmente impressas, pelo que as condições gerais do contrato de aluguer de longa duração dos autos lhe foram efectivamente comunicadas.

  8. É que a A., ora recorrente, não tem obrigatoriamente que ler e explicar aos seus clientes os contratos que com eles celebra - excepto evidentemente se estes não souberem ler ou tiverem dúvidas acerca do conteúdo do contrato e lho solicitarem -, o que a A. tem que fazer - e faz - é assegurar que as condições contratuais acordadas constam dos contratos antes de estes serem assinados, precisamente para permitir que quem use de "comum diligência" possa ler e analisar o contrato, e estar à disposição dos seus clientes para lhes prestar quaisquer esclarecimentos que estes lhe solicitem sobre os contratos que celebra.

  9. Foram assim inteiramente cumpridos por parte da A, ora recorrente, os deveres de comunicação e informação referidos.

  10. E, pois, manifesto que a ora recorrente cumpriu efectivamente o dever de comunicação previsto no artigo 5o do Decreto-Lei 446/85, de 25 de Outubro, com a redacção dada pelo Decreto-Lei n.° 220/95, de 31 de Janeiro.

  11. Ao decidir-se da forma que se fez no Acórdão recorrido, violou-se o disposto nos artigos 1045°, n° 2, 805°, alínea a) e 405° do Código Civil e no artigo 472° do Código de Processo Civil.

  12. Aliás, ainda que se entendesse - o que se refere a título meramente académico e por mero dever de patrocínio - que as condições gerais do contrato dos autos deviam ser excluídas, sempre os RR, ora recorridos estavam e estão obrigados a restituir à A., ora recorrente, o veículo dos autos, propriedade desta, pois como da própria sentença proferida em Ia instância e do Acórdão recorrido de fls. expressamente consta, o contrato dos autos é um contrato aluguer - a propriedade não passa a ser do locatário - sendo certo que foi também celebrada uma promessa unilateral de venda - que apenas produziria os seus efeitos caso o contrato de aluguer fosse integralmente cumprido, o que - COMO ESTÁ PROVADO NOS AUTOS - não se verificou no caso dos autos (vide doe. de fls. 206) 10. Os RR. o ora recorridos, estão, pois obrigados a restituir à A., ora recorrente, o veículo dos autos, propriedade desta. É, pois, ERRADA, e violadora da vontade das partes e do princípio da liberdade contratual, a não condenação na restituição à A do veículo dos autos, já que vai, contra a vontade das partes inequívoca e expressamente declarada no contrato dos autos, violando-se, assim, de forma flagrante o disposto no n.° 1 do artigo 405° do Código Civil.

  13. Ora, não se entende, como não se condena os RR, ora recorridos, a pagarem ao A., ora recorrente, um valor idêntico - face ao disposto no artigo 1045°. n° 2. do Código Civil - ao dobro do aluguer mensal, ou seja. € 763.08 por cada mês decorrido para além da data em que a R.. ora recorrida, deveria ter restituído ao A., ora recorrente, o veículo dos autos.

  14. Não assiste razão ao Senhor Juiz a quo ao não condenar os RR., ora recorridos, a pagar à A., ora recorrente, o valor dos alugueres em dobro como peticionado foi.

  15. Haja ou não resolução do contrato e no caso dos autos houve, o valor dos alugueres deveriam ter sido pagos pela recorrida, R. na acção, à recorrente, A. na acção, nas datas dos respectivos vencimentos, o que como resultou provado não se verificou.

  16. Atento o não pagamento pela recorrida R. ao A, ora recorrente dos alugueres nas datas dos respectivos vencimentos, é por demais evidente que este se constituiu em mora ex vi a alínea a), do n° 2, do artigo 805° do Código Civil donde, nos termos e de harmonia com o n° 2 do artigo 1045° do mesmo diploma legal assistir à ora recorrente, A. na acção, o direito de exigir um valor idêntico ao dobro do aluguer mensal, por cada mês decorrido para além da data em que a R„ ora recorrida, deveria ter restituído ao A., ora recorrente, o veículo até à data da efectiva recuperação de tal veículo 15. Está-se perante obrigações com prazo certo, pelo que o devedor se constitui em mora assim que incumpre ex vi alínea a), do n° 2, do artigo 805° do Código Civil.

  17. A A., ora recorrente, fundamenta o seu pedido respeitante à sanção pecuniária compulsória no disposto no artigo 829°-A do Código Civil, preceito introduzido no referido diploma legal...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO
8 temas prácticos
8 sentencias

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT