Acórdão nº 0999/09 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 17 de Março de 2010

Magistrado ResponsávelMIRANDA DE PACHECO
Data da Resolução17 de Março de 2010
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: 1- A Fazenda Pública vem recorrer da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela na parte em que, julgando parcialmente procedente a impugnação judicial deduzida por A’… e B…, com os sinais dos autos, na sequência de notificação de despacho de reversão proferido no processo executivo originariamente instaurado contra a sociedade “C…, Lda”, anulou a liquidação de IRC do ano de 1991, formulando as seguintes conclusões: 1ª - O procedimento de revisão da matéria colectável previsto no art° 91° da LGT, ocupa, na ordenação sistemática do procedimento de liquidação, o espaço que medeia entre a conclusão dos actos de Inspecção e a fixação definitiva da matéria colectável; 2ª - O prazo de 30 dias para requerer a abertura do procedimento, conta-se da data da notificação da fixação da matéria colectável e tem efeito suspensivo da liquidação do tributo.

3ª - Basta atentar na atribuição do efeito suspensivo da liquidação, para alcançar a conclusão de que o procedimento de revisão é sempre anterior à liquidação que suspende; 4ª - Esta conclusão, que decorre da natureza e da inserção sistemática do procedimento de revisão, no procedimento mais vasto de liquidação, sai reforçada pela formulação legal do prazo do exercício do direito; 5ª - Ao contrário do que acontece relativamente à reclamação graciosa e à impugnação judicial, o legislador não previu o momento adequado para o responsável subsidiário abrir o procedimento de revisão, fixando a data a partir da qual o requerimento haveria de ser apresentado; 6ª - E não o fez, acertadamente, em coerência com a solução que adoptou para os casos de reacção do responsável subsidiário contra a legalidade da liquidação subjacente à dívida que lhe é exigida na execução fiscal; 7ª - O n° 4 do art° 22° da LGT ao consagrar o direito de reclamação ou impugnação da dívida, tem em vista as formas típicas de reacção contra a ilegalidade dos actos de liquidação, ou seja a reclamação graciosa e a impugnação judicial; 8ª - Nem sequer se entenderia uma solução legal que pudesse conduzir, na maior parte dos casos, à impossibilidade de nova liquidação por via da caducidade, quando se sabe que a reversão, em regra, acontece muito para além dos quatro anos contados do facto tributário ou do ano seguinte ao do facto; 9ª - O disposto no n° 5 do art° 86° da LGT e no n° 1 do art° 117° do CPPT, não obstam que se admita a impugnação judicial deduzida pelo responsável subsidiário, nos termos do n° 4 do art° 22° da LGT, mesmo na falta de intervenção da comissão de revisão; 10ª - Se o procedimento de revisão só pode ser requerido no prazo de 30 dias contados da notificação da fixação da matéria colectável por métodos indirectos e nessa data é o responsável originário que é parte no procedimento, não pode exigir-se ao responsável subsidiário o cumprimento de condição de impugnabilidade que à data, não estava na sua disponibilidade; 11ª - O despacho que indeferiu a abertura do procedimento de revisão, por extemporaneidade, não enferma de qualquer ilegalidade, nem restringe os direitos impugnatórios dos responsáveis subsidiários; 12ª - O processo de impugnação judicial, em que vigora como princípio estruturante, o princípio do inquisitório, permite a tutela judicial efectiva dos direitos dos impugnantes, uma vez que o Juiz não só pode, como deve, aceitar a produção de prova requerida pelas partes, nomeadamente a pericial e ordenar todas as diligências que considere úteis ao apuramento da verdade; 13ª - Nos casos de responsabilidade subsidiária como é o dos presentes autos, a existência de pedido de revisão da matéria colectável não é condição de procedibilidade da impugnação judicial.

14ª - Porém, se esse não for o entendimento desse Venerando Tribunal e se considerar que a recusa de abertura do procedimento de revisão interposto pelos aqui impugnantes configura vício de forma por preterição de formalidade essencial; 15ª - Tal vício não poderá ter como consequência a anulação a liquidação nos termos da decisão sob recurso; 16ª - Ao contrário do decidido, um vício de forma por preterição de formalidade, ocorrido seis anos após o acto de liquidação impugnado, não pode projectar efeitos invalidantes sobre um acto tributário que o antecede; 17ª - A ilegalidade do acto tributário de liquidação, a existir, só poderá ser encontrada no procedimento que originou esse acto tributário e não, como resulta da sentença recorrida, em acto administrativo muito posterior e completamente distinto e exterior ao acto de liquidação; 18ª - A recusa em admitir o pedido de revisão, se ilegal, poderia e deveria ter sido objecto de recurso contencioso, nos termos da alínea p) do n° 1 do art° 97° do CPPT, por se tratar de questão tributária que não comporta apreciação da legalidade do acto de liquidação; 19ª - A sentença, na parte em que julgou procedente a impugnação com base em vício de forma por preterição de formalidade essencial, enferma de erro de julgamento, desde logo porque não se verificou a preterição de qualquer formalidade e, mesmo que assim não se entenda, a ter-se verificado, tal vício não pode ter consequências na legalidade da liquidação do IRC.

2- Não foram apresentadas contra-alegações.

3- Igualmente inconformado, vieram os revertidos A… e B…, recorrer da decisão na parte em que indeferiu o pedido de reconhecimento do ressarcimento de juros indemnizatórios relativo às liquidações anuladas, formulando as seguintes conclusões: 01- Vem o presente recurso interposto da Douta Sentença proferida no processo 240/04.3BEMDL do Tribunal Administrativo e Fiscal de Mirandela que julgou parcialmente procedente o pedido formulado pelos impugnantes, concretamente da parte em que indeferiu o pedido de reconhecimento do ressarcimento de juros indemnizatórios relativos às liquidações anuladas.

02- Porque as correcções de que resultou a liquidação adicional dos autos tiveram a sua origem na avaliação indirecta da matéria colectável os recorrentes deduziram o competente procedimento de revisão cujo exercício, como consta dos autos, veio a ser coarctado pela Administração Fiscal.

03- Neste sentido, existiu um verdadeiro e próprio erro dos Serviços da Administração Fiscal que significou um vício procedimental que, como decidido na Sentença a quo, redunda na preterição de formalidade essencial com a acertada consequência da anulação dos actos tributários.

04- Todavia, a Sentença a quo considerou serem indevidos juros indemnizatórios sobre as quantias que, ilegalmente, a A.F. arrecadou a título de imposto, por interpretar o n° 1 do artigo 43º no sentido em que a expressão “erro imputável aos serviços” constante dessa norma não abrange a preterição de formalidades essenciais por parte destes.

05- Salvo o devido respeito, e desde logo pelo elemento literal do artigo em mérito, não poderá tal interpretação proceder, já que este é suficientemente claro para elucidar o intérprete de que o erro imputável ao serviço é qualquer um que implique o pagamento de tributos que venha a ser considerado inquinado de ilegalidade.

06- Por outro lado também a interpretação teleológica e sistemática desse normativo tem sentido diverso do adoptado na Sentença em crise: trata-se do contraponto dos juros compensatórios devidos ao Estado e imputáveis ao contribuinte pelo atraso no pagamento dos impostos.

07- Acresce que o artigo 43° da L.G.T. materializa o comando previsto no artigo 22° da Constituição, prevendo um meio rápido, fácil e cómodo para os interessados obterem ressarcimento dos danos presumidos causados pela actuação da Administração.

08- Assim, os juros indemnizatórios constituem uma prestação devida automaticamente, ex-leges, assim que declarada a ilegalidade da liquidação, a significar que o Estado Fisco, em caso de procedência da impugnação judicial, fica obrigada à imediata e plena reconstituição da legalidade do acto ou situação objecto do litígio, compreendendo o pagamento de juros indemnizatórios a contar da data do pagamento até à data devolução do...

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